Governos da Argélia e de Marrocos financiaram o FSM de Dacar 2011
Para onde vai o Fórum Social Mundial?
Os Governos argelino e marroquino contribuíram para o financiamento do Fórum Social Mundial (FSM) que decorreu em Dacar. Uma informação que foi ignorada na reunião de 12 Fevereiro do Conselho Internacional do FSM e que já tinha circulado aquando do seminário dos movimentos sociais organizado em Dacar em 5, 6 e 7 de Novembro de 2010. Agora o Comité Organizador do Senegal confirmou-o!
Fica assim justificada a presença massiva no FSM da famosa delegação oficial marroquina, composta essencialmente por polícias e representantes de associações fantasma e de OVG (organizações verdadeiramente governamentais), apoiada pelo governo que pôs à sua disposição todos os meios logísticos para defender a "unidade territorial do país". E foi por isso, também, que esta mesma delegação oficial teve stands em todo o espaço da Universidade Chekh Anta Diop (UCAD) que acolheu o FSM. O governo senegalês é seguramente cúmplice e a comissão organizadora tem parte das responsabilidades. Alguns participantes criticaram a delegação como um todo, sem fazer distinções, o que prejudicou a imagem das organizações e movimentos sociais marroquinos e a dinâmica do Fórum Social de Marrocos.
O Fórum Social Mundial, que era até agora um espaço aberto às organizações sociais, está em vias de se tornar um terreno de ajuste de contas entre entidades políticas e receia-se que seja recuperado pelos governos. Alguns membros do Conselho Internacional do FSM criticaram o facto de ser dada a palavra, na sessão de abertura, ao presidente Evo Morales da Bolívia, bastante progressista, mas não disseram nada sobre o financiamento do fórum por governos neoliberais e anti-democráticos nem sobre o facto do presidente Abdoulaye Wade do Senegal ter sido alvo de agradecimentos, em três línguas, na sessão de encerramento do Fórum.
Dois aspectos positivos, no entanto, marcaram a 11ª edição do FSM (o segundo em África). Por um lado, a organização das caravanas que convergiram para Dacar, principalmente da África Ocidental mas também do Norte de África, permitiram uma maior sensibilização e mobilização das populações com a organização de várias actividades ao longo do caminho. A comissão organizadora, porém, não apoiou todas as caravanas mas apenas algumas delas e não previu o seu acolhimento nem o seu alojamento. As caravanas tiveram de ficar no acampamento da juventude em condições deploráveis, mesmo desumanas. Por outro lado, o espaço do fórum era aberto o que permitiu uma ampla participação em contraste com o FSM em Nairóbi, em 2007, onde o espaço era fechado e guardado por militares. Contudo, apesar dos anunciados 70.000 participantes, as implicações dos movimentos e organizações no Senegal e em particular o impacto sobre as populações locais foram muito relativos.
Para além disso, o Fórum foi uma desorganização total. Em nenhum momento se sentiu a presença do que quer que fosse de organizado. Um verdadeiro pesadelo! Nenhuma indicação, nenhum sinal, nenhuma repartição clara das salas (ou tendas) e, mais frequentemente, nenhuma tradução apesar do regresso da Babels ao FSM onde mobilizou e formou cerca de 120 intérpretes. Diga-se que as condições não estavam do seu lado. A presença de dezenas de jovens voluntários não ajudou a resolver o problema, já que estes benévolos não tinham informação para dar.
A mercantilização marcou também o Fórum. Quase todos os comerciantes da cidade vieram vender os seus produtos! Parecia uma feira internacional. Uma pequena garrafa de água que custa 250 FCFA nas lojas era vendida a 500 FCFA e uma refeição no restaurante da UCAD II custava 5.000 francos CFA (mais de € 7,50).
É de notar, no entanto, que por detrás de todos estes problemas houve um acto político cuja origem e finalidade permanecem desconhecidos: a nomeação de um novo reitor da universidade a um mês do FSM e a sua vontade de impugnar a decisão tomada uns meses antes de colocar à disposição do comité organizador o local da universidade. O que levou a que as renegociações consumissem tempo destinado à preparação e organização do evento. Finalmente, a comissão não conseguiu mais que 50 a 60% das salas previstas.
Dois pontos a destacar neste FSM: primeiro a manifestação de abertura, que foi muito importante, com a participação de 60.000 pessoas segundo os meios de comunicação social, algo nunca visto no Senegal. A marcha, que contou com a participação muito activa de organizações sociais senegalesas e movimentos dos subúrbios de Dacar, foi animada pelo grupo musical Hip Hop integrado na Rede Internacional CADTM. Depois, a realização de uma Assembleia dos Movimentos Sociais muito popular e participativa. A AMS foi um grande sucesso e reuniu mais de 2.000 pessoas com uma forte declaração final, com duas datas a fixar: o 20 de Março, dia de acção global de solidariedade e apoio ao processo revolucionário em curso no mundo Árabe, e o 12 de Outubro como dia de acção global contra o capitalismo. Dia que coincide com vários eventos: a resistência dos povos indígenas, a celebração da Mãe Terra, para comemorar o descobrimento da América por Cristóvão Colombo (12 de Outubro de 1492), que simboliza o nascimento do capitalismo global e se inscreve no quadro da Semana de Acção Global contra a dívida e as instituições financeiras internacionais.
As revoluções do povo tunisino e egípcio contra as ditaduras estiveram no centro deste FSM. Pela primeira vez uma acção concreta foi realizada durante o FSM (para além da tradicional marcha de abertura): um protesto em solidariedade com o povo egípcio foi organizado em frente à embaixada egípcia em Dacar no dia 11 de Fevereiro às 13h. Três horas depois chegou a notícia: o grande ditador Hosni Mubarak decidiu finalmente abandonar o poder após 18 dias de resistência do povo egípcio.
Estas duas revoluções mostraram que um "outro mundo possível" está prestes a realizar-se mas que isso passa por outros canais que não o Fórum Social Mundial.
Mimoun Rahmani
ATTAC / CADTM Maroc
NOTA - tradução BSP.
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