Manifesto
Escola Pública pela Igualdade e Democracia
A Escola Pública é uma conquista de que a esquerda só se pode orgulhar. Mas esta conquista está hoje esvaziada de quaisquer valores emancipadores. Atacada por todos os lados pela Direita e pela agenda neoliberal, a escola pública está em crise. Falhou na sua promessa de corrigir as assimetrias e diferenças sociais que atravessam o país: hoje, 75% dos filhos de pobres são pobres, a taxa de abandono escolar é de 39% (contra 15% da União Europeia), metade dos alunos reprova no ensino secundário e os últimos dados das comparações internacionais colocam a escola portuguesa na dianteira da reprodução das fronteiras sociais e culturais de partida.
A reprodução das desigualdades de origem e a exclusão escolar acompanham, sem variações, as rotas do insucesso: o interior do país, os concelhos mais pobres das áreas metropolitanas, os nichos guetizados dentro das cidades e subúrbios, as classes sociais mais desfavorecidas.
As políticas educativas das duas últimas décadas muito contribuíram para a desfiguração da escola pública. Reformas sobre reformas, e nas costas dos parceiros, uma trovoada de medidas legislativas, tantas vezes contraditórias, e orçamentos estrangulados foram marcas de uma constante: a debilidade das políticas públicas para a Educação, demonstrada pela persistência do insucesso e do abandono.
Sobre esta debilidade instalou-se o autoritarismo e mantêm-se o laxismo e a irresponsabilidade. Investido na ideologia da rentabilização e da gestão por resultados, que branqueia os verdadeiros problemas e encavalita a urgência dos números do sucesso nas costas dos professores, o PS oferece mais Governo e menos serviço público à educação. E na escola-empresa, que vai triunfando contra a escola-democrática, crescem novas burocracias feitas por decreto, centraliza-se o poder em figuras unipessoais, desenvolve-se a cultura da subordinação e do sacrifício acrítico.
Nenhum outro governo foi tão longe na amputação de direitos aos professores e na degradação das suas condições de trabalho, abrindo caminho à desvalorização social da escola pública e do papel dos profissionais de educação, que são o seu rosto . A resposta não se pode ficar pelo protesto. Ela exige o projecto, e há nas escolas experiências e práticas que são património e potencial deste projecto.
É urgente relançar a escola pública pela igualdade e pela democracia, contra a privatização e a degradação mercantil do ensino, contra os processos de exclusão e discriminação. Uma escola exigente na valorização do conhecimento, e promotora da autonomia pessoal contra a qualificação profissionalizante subordinada.
Somos pela escola pública laica e gratuita e que não desiste de uma forte cultura de motivação e realização, que não pactua com a angústia onde os poderes respiram. Uma escola que não desiste é aquela que combate a fatalidade: pelas equipas multidisciplinares e redes sociais, determinantes na prevenção e intervenção perante dificuldades de aprendizagem; pela valorização das aprendizagens não formais; pelas turmas mais pequenas e heterogéneas como espaço de democracia, potenciador de sucesso; pela discriminação positiva das escolas com mais problemas; pela real aproximação à cultura e à língua dos filhos de imigrantes.
Somos pela escola pública que assume @s alun@s como primeiro compromisso, lugar de democracia, dentro e fora da sala de aula, de aprendizagem intensa, apostada no debate para reflectir e participar no mundo de hoje.
Somos por políticas públicas fortes, capazes de criar as condições para que a escolaridade obrigatória seja, de facto, universal e gratuita e de assumir que o direito ao sucesso de todos e de todas é um direito fundador de democracia e é o desafio que se impõe à esquerda.
Porque queremos fazer parte da resposta emancipatória, empenhamo-nos na construção de um Movimento que promova a escola pública pela igualdade e pela democracia. Ao subscrever este Manifesto queremos dar corpo a uma corrente que mobilize a cooperação contra a competição, a inclusão contra a exclusão e o preconceito, que dê visibilidade a práticas e projectos apostados numa escola como espaço democrático, de cidadania, de conhecimento e de felicidade, porque uma outra escola pública é possível.
Primeiros subscritores:
Arsélio Martins (Professor de Matemática, Aveiro); Ana Maria Pessoa (Escola Superior de Educação de Setúbal); Sérgio Niza (Movimento Escola Moderna); Ana Filgueiras Soares (Vice Presidente da Associação Cidadãos do Mundo); José Luis Peixoto (Escritor); Beatriz Dias (Professora de Biologia, Lisboa); Boaventura Sousa Santos (Sociólogo); Cecília Honório (Professora de História, Lisboa); João Curvelo (Associação de Estudantes da Escola Secundária Raínha Dona Leonor, Lisboa); Almerinda Bento (UMAR, Professora de Inglês do ensino básico, Seixal); João Paraskeva (Universidade do Minho); Catarina Alves (Associação de Estudantes da Escola Secundária de Gondomar); António Avelãs (Presidente do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa); Teresa Cunha (Escola Superior de Educação de Coimbra); José Manuel Pureza (Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, núcleo de estudos pela Paz); Helena Ralha simões (Escola Superior de Educação, Universidade do Algarve); Chullage (Músico, Associação Khapaz); Manuela Tavares (Professora do ensino secundário, Almada); António Sousa Ribeiro (Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra); Maria José Vitorino (Professora bibliotecária, Lisboa); Jonas Lopes Vilar (Presidente da Interculturalidade – Associação de Professores); Maria Helena Caldeira Martins (Universidade de Coimbra); Fernando Cruz (Presidente da AGIR- Associação para a Investigação e Desenvolvimento Sócio-Cultural, Porto); Luísa Sola (Escola Superior de Educação de Setúbal); João Antunes (Psicólogo, dirigente do SOS Racismo, Porto); Maria José Araújo (Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação do Porto); Paulo Peixoto (Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra); Heloísa Luz (Professora do ensino secundário, Pinhal Novo); Manuel Grilo (Sindicato dos Professores da Grande Lisboa); Deolinda Devesas (Professora do ensino secundário, Lagos); Fernando Rosas (Historiador); Marta Araújo (Universidade de Coimbra, doutorada em Sociologia da Educação pela Universidade de Londres); Joaquim Raminhos (Professor do ensino básico, Director Centro de Formação de Docentes do Concelho da Moita); Albertina Pena (Professora, Lisboa); Joaquim Sarmento (Movimento Escola Moderna); Berta Alves (Professora do ensino secundário, Lisboa); Rodrigo Rivera (Associação de Estudantes da Escola Secundária Jaime Cortesão, Coimbra); Paula Capelo (Professora, EB 2/3 D.João I, Baixa da Banheira); Manuel Portela (Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, director do Teatro Académico Gil Vicente); Alda Matos (Escola Superior de Educação de Coimbra); João Teixeira Lopes (Sociólogo); Anabela da Silva Moura (Escola Superior de Educação Instituto Politécnico de Viana do Castelo); Luís Farinha (Professor, Director adjunto da Revista História).
Este Manifesto pode ser subscrito em: http://www.petitiononline.com/mudar123/petition.html.
1 comentário:
Talvez muitos portugueses ainda não se tenham apercebido de que as reprovações nas escolas públicas vão ser gradualmente banidas. A tendência é que ao fim de 12 anos de escola todos os alunos possam ter o 12.º ano de escolaridade
O nível de conhecimentos poderá ser muito baixo e inconsistente, mas poderão deverão ostentar "orgulhosamente" o certificado de habilitações do 12.º ano, que, afinal, é tão só a escolaridade mínima obrigatória. Portugal poderá assim figurar nas estatísticas como sendo um país com uma população com bastantes anos de escolaridade, embora isso não dê qualquer indicação em termos de conhecimentos dos portugueses.
Nas escolas públicas, os alunos poucas possibilidades terão de atingir os conhecimentos necessários para prosseguirem os estudos.
Com este panorama, os pais que desejem para os seus filhos um curso superior têm que começar já a consciencializar-se de que a escola pública não será o caminho mais aconselhável para a preparação dos seus filhos; nem para o prosseguimento de estudos, nem para o desempenho de funções com maior complexidade.
Ainda que algumas crianças e jovens se interessem pelos estudos o ambiente será impróprio para que tenham sucesso, porque na mesma sala coexistirão alunos com deficiências várias: alguns delinquentes, outros com fracos conhecimentos adquiridos anteriormente por falta de assiduidade às aulas ou porque não havendo reprovações, não haverá necessidade de empenho nos estudos; outros porque têm deficiências psíquicas e até de comunicação; muitos sem qualquer interesse pelas matérias escolares e que apenas por ali andam porque o sistema a isso os obriga.
Zé da Burra o Alentejano
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