sábado, fevereiro 09, 2008

Carta Aberta ao Presidente da República de Moçambique


Os últimos acontecimentos em Moçambique, provocados pelos aumentos nos transportes e na alimentação, levou alguns moçambicanos a manifestarem a sua preocupação pelas políticas seguidas pelo governo e a apelarem a uma intervenção do PR. Lembremos que nos últimos anos Moçambique tem sido louvado por algumas instituições internacionais pela sua elevada taxa de crescimento económico (uma das mais altas de África).


CARTA ABERTA AO PRESIDENTE DA REPUBLICA A PROPÓSITO DA REVOLTA POPULAR EM MAPUTO!
Sua Excia Senhor Presidente da República,

Excia,

Dirijo-me a si, na sua qualidade do mais alto magistrado da nação!

Excia,

Um acontecimento sem precedentes registou-se ontem na capital do pais. Pela primeira vez depois da independência nacional a população de Maputo saiu à rua com um único propósito - dizer de forma clara e inequivoca de que já está farto das instituições estatais e que pelo menos desta vez, iria resolver os seus problemas, usando as suas próprias mãos! Trazendo para si, a solução dos seus problemas! E para surpresa de todos, RESOLVEU!

Excia, como deve se recordar os manuais da teoria do estado, dizem que o estado nasceu quando o povo decidiu passar parte da sua soberania para uma entidade própria, em troca de bens públicos -segurança, estradas, justiça entre outras. E que tal entidade exerceria o poder e a soberania 'emprestada' em nome desse povo, estabelecendo assim uma espécie de contrato social, com direitos e deveres de ambas as partes!

Só que no nosso caso Excia, parece que o contrato social se rompeu, ou está em vias de se romper. Uma das partes, o povo, cansou-se da ineficiência da outra. Cansou-se e parece que quer recuperar se não toda pelo menos uma parte dos poderes 'emprestados'. Só que Excia, a história mostra-nos que quando o poder cai na rua, as consequências poem ser catastróficas, porque muitas das vezes ao invés de usar a razão o povo pode decidir baseado em emoções, com consequências catastróficas para ele prprio e para o estado.

Excia, dizia eu que um acontecimento sem precedentes se registou ontem. Um acontecimento que a seu ver pode parecer minúsculo, uma pequenha ranhura no edificio da democracia. Mas essa ranhura pode ser apenas a ponta do iceberg!

Este acontecimento deve ser analisado de forma franca e fria pela sociedade mocambicana. Pela classe académica, empresarial e politica, porque pode vir a ter consequências graves para a legitimidade e sobevivência do estado moçambicano.

Uma coisa é a população de um bairro fazer justiçaa pelas próprias mãos atiçando um pneu na rua ou no corpo do suspeito ladrão ou assassino. Outra coisa á a população de vários bairros, quase que de forma espontanea sair das ruas e dizer não a uma medida social.

Criou-se um precedente. E o 'recuo' do governo ou de quem quer que tenha tomado a decisão, mostrou inequivocamente e feliz ou infelizmente, que a solução, por mais racional ou irracional que pareça , FUNCIONA!

Ora funcionando então, a lógica dita que pode vir a ser re-activada! E ao ser reactivada quando as circumstancias assim o obrigarem, estará consumada a des-legitimização do estado, que iniciou há anos, mas que ontem atingiu um ponto sem retorno!

Excia,

Os sinais de uma possivel convulsão social não são de hoje. A justiça pelas próprias mãos, a não participação nos actos eleitorais ou seja o elevado número de abstenções em momentos eleitorais, o crescimento da criminalidade, são sinais inequivocos de uma sociedade amordaçada que clama em ser ouvida. Ou, de uma sociedade que no minimo não tem mecanismos para ser ouvida e influenciar decisões. E isso é grave. Não é por acaso que as tampas das panelas têm furos, que permitem que parte da energia proveniente do calor se vá libertando aos poucos. Infelizmente parece que a tampa da nosa panela social tem tais furos entupidos. E cabe a si, entanto que magistrado mais alto da nação ordenar a limpeza de tais 'furos sociais' para que a força, a energia se vá libertando.

Este aspecto deve ser analisado. Recordemo-nos dos vários estudos sobre a situação social e a possibilidade de erupção de conflitos violentos em Moçambique feitos por entidades quer nacionais quer internacionais (DfID, Swiss Peace e outros).

Excia,

Gostaria de chamar a sua atenção para um outro ponto. O grau de violência das manifestações, que não pouparam as suas vitimas fossem elas agentes do estado ou privados. Ou seja a panela estava tão quente (e a população tão 'aborrecida') que não lhe interessavam as consequências dos seus actos. Foram partidas montras, partidos vidros de carros públicos e particulares, e mesmo um posto de abastecimento de combustivel não foi poupado! E a responsabilidade por estes danos cabe ao estado pois é o estado que detém o monopólio da violência e tem o dever de garantir a segurançaa quer dos bens como dos individuos.

Mas para mim acima de tudo isto ficou, uma mensagem clara para a sociedade Moçambicana e para a comunidade internacional. O velocimetro que estamos a usar para medir a nossa velocidade nacional; o termómetro que estamos a usar para medir a temperatura do nosso corpo nacional, não é nosso e nem foi feito para seres humanos da nossa espécie! A medida para os nossos problemas, o juiz do nosso progresso social não é e não deve ser o Banco Mundial!

Explico-me Excia,

Os distúrbios acontecem um dia depois de o presidente do Banco Mundial em pessoa ter visitado o pais (Maputo, Sofala e Inhambane) e ter dado não apenas uma nota positiva ao governo, mas sim uma nota de despensa!

Estao Excia, como é que se explica que depois de despensar com nota de luxo, menos de 24 horas passadas temos a convulsão que temos?

Para mim Excia, o povo, esse 'animal' soberano chumbou não apenas a despensa dos senhores do mundo como dos seus colaboradores nacionais, que V. Excia representa, dizendo com voz própria e bem audível - BASTA!

Reflictamos pois moçambicanos sobre os caminhos a seguir! Tenhamos a coragem e destreza necessária para longe de emoções momentaneas ou Mandraianas, dicutirmos à sombra da mafurreira ou da mangueira o pais real - o nosso pais real e não o país deles. Sim o pais real e não o ficticio ou das aritiméticas de Bretton Woods.

Já dissemos em vários foruns para quem nos quis ouvir que 'crescimento económico não é igual a desenvolvimento'!

Não permitamos que o nosso estado se des-legitimize ao ponto de não servir para resolver os problemas mais elementares da sobrevivência humana! O povo soberano falou, falta sabermos se os detentores do poder, a classe académica, empresarial e sobretudo a politica tem ouvidos para ouvir! Falta saber se haverá destreza necessária para diagnosticar o mal pela raiz ou então se uma vez mais esconderemos a cabeçaa deixando o rabo de fora, dizendo que o 'povo foi instrumentalizado', que o povo foi 'usada' que as manifestaçõs foram 'organizadas' por forças externas, os tais e eternos 'inimigos do povo e da nação moçambicana'

Excia,

Chega de Quenias, chega de Chades, chega de Liberias, chega de Serra Leoas, Eritreias, Congos!

Defendamos a nossa sobrevivência em tanto que NAÇÃO moçambicana! O senhor, como o mais alto magistrado da nação, tem uma palavra a dizer na forma como é gerida a 'coisa pública'!

Aguardamos o seu pronunciamento e quiçá o cachimbo da paz social!

Sabemos que recentemente fez anos. Tambem sabemos que acaba de celebrar tres anos do seu mandato. Seria de mau tom terminarmos esta carta sem lhe desejamos parabéns e 'bom apetite' no consumo da prenda que o povo de Maputo lhe ofereceu ontem!

E mais não disse!

Manuel de Araujo

www.manueldearaujo.blogspot.com

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