segunda-feira, outubro 22, 2007

Criticas ao OG Do Estado 2008

O ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2008: um orçamento que agrava a injustiça fiscal e não promove o investimento nem o crescimento
Por Eugénio Rosa

RESUMO DESTE ESTUDO
O governo acabou de apresentar a sua proposta de OE2008. Uma análise fundamentada dessa proposta leva às seguintes conclusões: (1) O governo tem conseguido reduzir os valores do défice devido também a desorçamentação crescente; (2) A receita fiscal perdida devido aos benefícios fiscais, fundamentalmente a empresas, disparou com o governo de Sócrates; (3) A proposta de OE2008 vai agravar ainda mais a injustiça fiscal, nomeadamente a que atinge os trabalhadores; (4) Contrariamente àquilo que Sócrates e o seu ministro das Finanças tentaram fazer crer, 2008 não será um ano de viragem no investimento público, já que não se verificará em 2008 um aumento significativo do investimento pois, em termos reais, o realizado em 2008 é praticamente igual ao de 2007.

O governo tem conseguido reduzir o défice também à custa de uma desorçamentação crescente que não se fala. E o método utilizado tem sido o de retirar do âmbito do OE múltiplas entidades transformando-as em entidades empresarias. Primeiro, foram os hospitais empresas. Para se ficar com uma ideia do impacto que isso teve no défice orçamental basta dizer que os prejuízos acumulados por estes hospitais empresa (Hospitais EPE) somaram, no período 2003-1º semestre de 2007, cerca de 530 milhões de euros. Se estes hospitais não fossem entidades juridicamente independentes os prejuízos acumulados iriam somar ao défice orçamental. Assim, não vão. Mais recentemente o governo transformou as Estradas de Portugal, que era o instituto responsável pela construção de toda a infraestrura rodoviária numa sociedade anónima. Também os prejuízos que eventualmente se registarem nela já não contam para o défice orçamental. Reduz-se o défice, mas diminui-se a transparência. E isto porque escapará ao controlo da Assembleia da República, podendo o governo transformá-la facilmente num instrumento de propaganda eleitoral.

A proposta de OE2008 que o governo apresentou vai determinar um aumento da injustiça fiscal, porque as receitas dos impostos indirectos, que são os mais injustos, vão aumentar muito mais do que as receitas que têm como origem os impostos directos. Assim, em 2007, por cada 100 euros de receitas fiscais arrecadadas 40,5 euros tinham como origem impostos directos, e 59,5 euros impostos indirectos. Em 2008, como resultado da proposta de OE do governo, em cada 100 euros de receitas fiscais, apenas 39,9 euros terão como origem impostos directos e 60,1 euros impostos indirectos. Em milhões de euros, entre 2007 e 2008, os impostos directos aumentarão em 553 milhões de euros, enquanto os impostos indirectos subirão em 1.395 milhões de euros, ou seja, 2,5 vezes mais.

A manipulação da taxa de inflação pelo governo tem sido um instrumento utilizado para impor sacrifícios aos trabalhadores. Efectivamente, a taxa de inflação prevista pelo governo, que consta todos os anos do OE, tem sido sistematicamente inferior à que depois se verifica. Mas é a taxa prevista que o governo utiliza para actualizar os escalões do IRS e outras deduções. Por ex., a taxa de inflação prevista pelo governo para 2008 é apenas de 2,1%, e é com base nesta percentagem que são foram actualizados os escalões do IRS da proposta. É também de prever que o governo, utilizando a taxa de inflação que ele próprio fixou, tente impor aos trabalhadores da Administração Publica um aumento de vencimentos reduzido, e que depois até diga que ele até permitiu aumentar o poder de compra destes trabalhadores.

Em contrapartida, com o governo de Sócrates os benefícios fiscais, nomeadamente a empresas, que fazem perder ao Estado, todos os anos, milhões de euros de receitas fiscais dispararam. Em 2005, os benefícios fiscais determinaram a perda de 2.335,6 milhões de receitas, sendo 1.581,9 milhões de euros (67,7%) a nível do IRC e na Zona Franca da Madeira. Em 2008, o governo prevê que a receita perdida devido aos benefícios fiscais concedidos atinja 2.889 milhões de euros, ou seja, 1079 milhões de euros em relação à Zona Franca da Madeira e mais 291 milhões de euros de IRC.

O governo, através do 1º ministro e do ministro das Finanças, afirmou que 2008 seria uma ano de viragem no investimento público, pois verificar-se-ia um aumento elevado deste. No entanto, a análise do PIDDAC sem Estradas de Portugal mostra que o aumento é apenas de 3,1% relativamente a 2007 e é inferior em mais de 12% ao valor do PIDDAC de 2006. Isto em valores nominais, pois se se deduzir o efeito do aumento de preços, o PIDDAC de 2008 é praticamente igual ao de 2007 em termos reais, e regista uma diminuição de -19% em relação ao de 2006. Se se tiver presente que apenas cerca de 74% do valor orçamentado é normalmente executado rapidamente se conclui que o efeito do PIDACC2008 para ultrapassar a crise em que a Economia Portuguesa já está mergulhada há vários anos será certamente muito reduzido em 2008.

O actual governo acabou de apresentar na Assembleia da República e ao País a sua proposta de OE para 2008. E como era previsível fê-la acompanhar de uma barragem de propaganda que só pode confundir e tornar mais difícil a leitura e a compreensão do orçamento apresentado. Neste estudo, utilizando dados oficiais, alguns deles constantes da própria proposta vamos procurar analisá-la de uma forma fundamentada e objectiva.

Um dos argumentos que tem sido mais utilizados pelo governo ao longo dos últimos 3 anos é que, segundo ele, a sua politica se caracterizaria pelo rigor e transparência. A estes dois argumentos que já são velhos, juntou para 2008 mais um, que é o seguinte: o investimento público vai aumentar muito em 2008 declarou o 1º ministro. Portanto, 2008, seria já um ano diferente, de viragem. Segundo o Ministro das Finanças o investimento do subsector Estado aumentaria mais de 20% em 2008, e o do PIDDAC mais de 6%. Mas será isto verdade?


UMA DESORÇAMENTAÇÃO CRESCENTE E A FALTA DE TRANSPARÊNCIA

A primeira coisa que interessa recordar aos fundamentalistas da redução do défice, entre os quais está todo o todo o governo e uma grande parte do PS, é que a redução do défice não é um fim em si mesmo, mas apenas um meio que deve servir para criar condições ao crescimento económico e ao desenvolvimento sustentado e elevado do País. Quando se transforma a redução do défice em fim, como faz este governo, pois passa o tempo a glorificá-la, está-se a caminhar rapidamente para uma situação em que a redução do défice transforma-se num instrumento de estrangulamento da economia, e mesmo numa obsessão em que não se consegue ver mais nada.

Para além disso, e isso é um aspecto que muitas vezes é ignorado ou mesmo conscientemente ocultado, essa redução tem sido conseguida também em parte por processos de engenharia financeiras, que o PS tanto criticou ao PSD/CDS. A prová-lo estão os chamados Hospitais empresas e, recentemente, a transformação das Estradas de Portugal numa sociedade anónima.

Para que isso se torne rapidamente claro, observem-se os dados do quadro seguinte, onde para os anos de 2003-2007, se encontram os “proveitos” e “custos” dos Hospitais SA, que depois transformados em Hospitais EPE.

QUADRO I – Prejuízos acumulados pelos hospitais empresa no período 2003 – 1º sem.2007
ANOS
PROVEITOS-Milhões€
CUSTOS-Milhões €
RESULTADOS-Milhões €
Operacionais
TOTAIS
Operacionais
TOTAIS
Operacionais
TOTAIS
2003-HSA
1.778,7
1.864,4
1.953,6
1.990,3
-175,0
-125,9
2004 –HSA
1.897,3
2.030,5
2.066,7
2.121,6
-169,4
-91,2
2005-HSA/HEPE (*)
2.097,1
2.321,6
2.249,7
2.413,0
-123,9
-123,9
2005-HSA/EPE (*)

3.094,8

3.093,8

1,00
2006- HEPE

2.867,7

3.054,5

-189,3
2007-1ºSem.-HEPE

1.761,1

1.889,0

-127,9
SOMA 2005-03
5.773,1
6.216,5
6.270,1
6.524,9
-496,9
-340,9
SOMA 2007-2003 (*)

10.845,3

11.468,4

-214,1
SOMA 2007-2003 (*)

11.618,5

12.149,2

-530,7
FONTE: Evolução dos elementos económicos financeiros dos Hospitais EPE- 2003/1ºsem.2007-ACSS
(*) Em relação a 2005 foram publicados dois valores pelo ACSS (Ministério da Saúde) que são os do quadro

No período 2003-1º sem.2007, os hospitais públicos, transformados em hospitais empresas, primeiro chamados no tempo do governo PSD/CDS Hospitais-SA e, depois com governo de Sócrates, Hospitais EPE acumularam prejuízos que deverão ter atingido já 530,7 milhões de euros (os dados sobre os resultados dos hospitais empresa que a Administração Central do Sistema de Saúde – ACSS – publicou são diferentes em relação ao mesmo ano, por isso incluímos no quadro dois dados referentes a 2005 o que mostra bem o rigor do governo PS, ou a falta dele, que tanto o 1º ministro gosta de gabar-se). Como estes hospitais empresas são considerados entidades juridicamente independentes, os prejuízos que se acumulam neles já não entram para o cálculo do défice orçamental. E como governo tutela esses hospitais empresa, tem poder para impor a eles contratos programa (orçamentos) em que os pagamento do Estado a esses hospitais são insuficientes para cobrir a totalidade dos seus custos. Desta forma, reduz o défice, o que contribui para alcançar o objectivo que fixou para aquele, transferindo uma parcela desse défice para os hospitais empresas que assim acumulam prejuízos.

Mais recentemente o governo de Sócrates transformou a Estradas de Portugal, que era um instituto público , numa sociedade anónima. Desta forma, com uma cajadada mata dois coelhos. Em primeiro lugar, reduz e limita as transferências do OE para as E.P.,contribuindo assim para a redução do défice (em 2007, o investimento das E.P. previsto em infraestruturas rodoviárias é de 1.471 milhões de euros, e as transferências do OE para as EP são apenas de 478 milhões de euros, ou seja, o correspondente a 32,5%. Para poder investir aqueles 1.471 milhões de euros, as E.P. teve naturalmente de se endividar fortemente. Transformando-a numa sociedade anónima, como o governo fez, por um lado, facilita a sua privatização e, por outro lado, cria as condições necessárias para que os prejuízos que eventualmente se verifiquem não tenham qualquer impacto no aumento do défice orçamental.

O AGRAVAMENTO DA INJUSTIÇA FISCAL

A proposta de OE2008 apresentada pelo governo vai determinar um agravamento ainda maior da injustiça fiscal em Portugal, como mostra o quadro seguinte construído com dados constantes do relatório que acompanha essa proposta.

QUADRO II – Variação dos Impostos Directos e dos Impostos Indirectos entre 2007 e 2008

2007
2008
Variação
% do TOTAL
IMPOSTOS
Milhões de euros
%
2007
2008

(OE)
(OE)
2008-07


IRS
8.770,0
9.252,0
5,5%
25,0%
25,0%
IRC
5.430,0
5.511,0
1,5%
15,5%
14,9%
Outros
20,0
10,0
-50,0%
0,1%
0,0%
IMPOSTOS DIRECTOS
14.220,0
14.773,0
3,9%
40,5%
39,9%
ISP
3.170,0
3.360,0
6,0%
9,0%
9,1%
IVA
13.100,0
14.145,0
8,0%
37,3%
38,2%
ISV
1.184,0
1.120,0
-5,4%
3,4%
3,0%
IT
1.325,0
1.430,0
7,9%
3,8%
3,9%
Selo
1.735,0
1.830,0
5,5%
4,9%
4,9%
IUC/IC
88,0
111,0
26,1%
0,3%
0,3%
Outros
263,0
264,0
0,4%
0,7%
0,7%
IMPOSTOS INDIRECTOS
20.865,0
22.260,0
6,7%
59,5%
60,1%
TOTAL
35.085,0
37.033,0
5,6%
100,0%
100,0%
FONTE: Relatório OE 2008

Os impostos directos são impostos mais justos, porque têm em conta o rendimento auferido por cada contribuinte. Em principio pagam mais os que têm maiores rendimentos. E isto porque as taxas do impostos são progressivas (ex. IRS). Pelo contrário, os Impostos Indirectos são mais injustos porque não atendem ao volume de rendimento do contribuinte. Por ex., um contribuinte que receba o salário mínimo e um outro cujo rendimento seja 10 vezes superior ao salário mínimo quando compra o mesmo maço de cigarros pagam a mesma importância de imposto de tabaco. Sob uma aparente igualdade esconde-se uma profunda desigualdade.

A proposta de OE2008 que o governo apresentou vai determinar que aquela desigualdade aumente bastante num único ano. Como revelam os dados do quadro, em 2007, por cada 100 euros de receitas fiscais arrecadadas 40,5 euros tinham como origem impostos directos, e 59,5 euros impostos indirectos. Em 2008, como resultado da proposta de OE apresentada, em cada 100 euros de receitas fiscais, apenas 39,9 euros terão como origem impostos directos e 60,1 euros impostos indirectos. Em milhões de euros, até para se tornar mais claro o agravamento da injustiça fiscal que se verificará, interessa dizer que, entre 2007 e 2008, os impostos directos aumentarão em 553 milhões de euros, enquanto os impostos indirectos subirão em 1.395 milhões de euros, ou seja, 2,5 vezes mais. Interessa chamar a atenção, como mostram os dados do quadro, que, entre, 2007 e 2008, as receitas de IRS que são pagas fundamentalmente pelos trabalhadores (mais de 80% dos rendimentos sujeitos a IRS são dos trabalhadores por conta de outrem e dos pensionistas), aumentarão, segundo o OE2008, 5,5% (+482 milhões de euros),enquanto a receita do IRC, paga pelas empresas, subirá apenas 1,5%. (81 milhões de euros, ou seja, 3,6 vezes menos (em euros , 5,2 vezes menos).

AS DESPESAS COM OS BENEFICIOS FISCAIS ÀS EMPRESAS DISPARAM COM O GOVERNO DE SÓCRATES E A FALTA DE TRANSPARÊNCIA E DE RIGOR AGRAVA-SE

Enquanto a carga fiscal que incide sobre as classes de menor rendimento, nomeadamente trabalhadores e pensionistas, aumentará significativamente com a proposta do governo, os benefícios fiscais concedidos às empresas dispararam com Sócrates como mostra o quadro seguinte construído com dados constantes do próprio relatório OE2008.


QUADRO III – Receita fiscal perdida pelo Estado devido aos benefícios fiscais concedidos 2007-08

ORÇAMENTO 2007
ORÇAMENTO DE 2008
VARIAÇÃO
IMPOSTOS
2005
2006
2007
2005
2006
2007
2008
VARIAÇÃO
2007-2005
VARIAÇÃO

Milhões euros
Milhões euros
Milhões euros
Milhões euros
Milhões euros
Milhões euros
Milhões euros
OE2007
OE2008
2008-05
IRS
563,3
211,6
386,3
382,3
229,8
341,4
346,1
-31,4%
-10,7%
-9,5%
IRC
226,9
246,2
241,0
259,0
255,8
275,0
291,0
6,2%
6,2%
12,4%
IS



0,2
1,1
0,4
0,2



IA
73,2
72,0
57,0
56,8
59,6
58,8
63,8
-22,1%
3,5%
12,3%
IVA
90,0
118,3
99,5
99,2
118,3
99,7
90,2
10,6%
0,5%
-9,1%
ISP
247,6
159,4
301,4
210,8
240,1
269,4
306,5
21,7%
27,8%
45,4%
IABA
0,9
0,9
0,9
0,7
0,6
0,6
0,6
0,0%
-14,3%
-14,3%
IT
0,5

0,5
0,5
0,5
0,5
0,6
0,0%
0,0%
20,0%
SOMA
1.202,4
808,4
1.086,6
1.009,5
905,8
1.045,8
1.099,0
-9,6%
3,6%
8,9%
IRC- Zona Franca Madeira
1.056,2
983,3
1.000,0
1.326,1
1.356,1
1.786,0
1.790,0
-5,3%
34,7%
35,0%
TOTAL
2.258,6
1.791,7
2.086,6
2.335,6
2.261,9
2.831,8
2.889,0
-7,6%
21,2%
23,7%
FONTE: Relatório do OE2007 - Pág. 114 e 116 e Relatório OE 2008 págs. 129-140




Em primeiro lugar, interessa explicar porque razão aparecem no quadro dados referentes aos mesmos anos – 2005, 2006 e 2007 – do Relatório do OE2007 e do Relatório do OE2008. Como o leitor rapidamente concluirá comparando os dados do OE2007 com o OE2008, referentes a 2005, 2006 e 2007, eles são muito diferentes. As diferenças são de milhões de euros. É um exemplo claro e quantificado do “rigor e transparência” (ou da falta dele), do governo de Sócrates.

Por outro lado, se analisarmos os valores dos benefícios fiscais, ou seja, da receita fiscal perdida pelo Estado, constantes do Relatório do OE2008, concluímos que eles dispararam, nomeadamente os concedidos às empresas. Em 2005, eles determinaram a perda de 2.335,6 milhões de receitas, sendo 1.581,9 milhões de euros (67,7%) a nível do IRC e na Zona Franca da Madeira. Em 2008, o governo prevê que a receita perdida atinja 2.889 milhões de euros, mais 553,4 milhões de euros, sendo 291 milhões de euros a nível do IRC e 1.790 milhões na Zona Franca da Madeira (70,4% do total de receita perdida). Com ajudas destas, os ricos estão a ficar mais ricos e a maioria da população mais pobre. É assim possível baixar a elevada carga fiscal que incide sobre os trabalhadores e pensionistas reduzindo os escandalosos benefícios fiscais às empresas, que fazem perder, todos os anos, receitas tão elevadas ao Estado.

A MANIPULAÇÃO DA TAXA DE INFLAÇÃO PELO GOVERNO PARA IMPOR SACRIFICIOS AOS TRABALHADORES E AOS PENSIONISTAS

Um dos instrumentos que o governo tem utilizado para impor e justificar sacrifícios aos trabalhadores e reformados é a manipulação da taxa de inflação. E o processo é simples e é sempre o mesmo.

QUADRO III – Taxa de inflação prevista no Orçamento do Estado e taxa de inflação verificada
ANOS
TAXA INFLAÇÃO
DIFERENÇA

Governo(constante do Orçamento do Estado)
Verificada do INE
Governo - INE
2005
2,0%
2,3%
-0,3%
2006
2,3%
3,1%
-0,8%
2007
2,3%
2,4%
-0,1%
2008 (P)
2,1%
2,4%
-0,3%
Variação 2008-2005
9,0%
10,6%
-1,6%
FONTE: OE: Relatório; Verificada : INE, excepção 2008 que é uma estimativa feita c/ base inflação Agosto2007

A taxa de inflação prevista pelo governo, que consta do OE, é sistematicamente inferior à taxa de inflação que depois se vem a verificar. No entanto, o governo utiliza a sua taxa de inflação para “actualizar”, por exemplo, os escalões do IRS e muitas outras deduções que beneficiam os trabalhadores. Por ex., em 2006, os escalões do IRS foram aumentados apenas em 2,3%, quando a inflação subiu em 3,1%. Em 2008, utilizando a sua previsão de aumento de preços, o governo actualizará os escalões de IRS em apenas 2,1%. É de prever que o governo utilize a sua previsão de taxa de inflação para 2008 para limitar os aumentos dos vencimentos dos trabalhadores da Administração Pública a um aumento de 2,1% ou a uma percentagem muito próxima desta.

O AUMENTO DO INVESTIMENTO PUBLICO EM 2008 É UM ENGANO

Pouco tempo antes de apresentar a proposta de OE2008, Sócrates declarou aos media que 2008 seria um ano diferente em termos de investimento público, pois este iria aumentar significativamente no próximo ano. Teixeira dos Santos durante a apresentação do OE2008 afirmou ( estamos a citar de memoria) que o PIDACC aumentaria cerca de 6% em 2008. Por isso, interessa analisar esta questão importante para a economia e sociedade portuguesa de uma forma fundamentada e objectiva. Para isso, vamos analisar a evolução que se verificará a nível do PIDDAC, que é o programa de investimentos mais importante da Administração Central do Estado.

O PIDDAC de 2008 não é directamente comparável com o de 2007 ou de 2006. E isto porque o PIDDAC de 2008 não inclui os investimentos feitos através das Estradas de Portugal que até ao fim de 2007 eram incluídos no PIDDAC, e que a partir de 2007, como a transformação da E.P.em sociedade anónima, deixarão de o ser. E os investimentos que se realizam através da EP, que são os feitos em infraestruturas rodoviárias, constituem uma componente importante do investimento público total.

Para tornar comparável o PIDDAC de 2008, com o dos dois anos anteriores, é necessário expurgar do PIDDAC de 2006 e 2007 o investimento feito através da EP utilizando dados que obtivemos do governo quando estivemos na Assembleia da República como deputado durante o debate do OE2007. E isto porque o PIDDAC de 2008 já não inclui os investimentos realizados através das Estradas Portugal. Os resultados obtidos constam do quadro seguinte.

QUADRO IV – Variação do valor do PIDDAC sem Estradas de Portugal no período 2006-2008
ANOS
PIDDAC Orçamentado (OE)
Estradas de Portugal (**)
PIDAAC sem Estradas Portugal
Executado em cada ano (***)
EXECUTADO
Aumento Preços
Milhões euros
Milhões euros
Milhões euros
%
Milhões euros
2006
4.853,6
738,9
4.114,7
74,0%
3.044,9
3,1%
2007
4.978,1
1.471,0
3.507,1
74,2%
2.602,3
2,4%
2008(*)
3.616,1

3.616,1
74,1%
2.679,5
2,4%
2008-2007


3,1%

3,0%
4,9%
2008-2006


-12,1%

-12,0%
8,1%
(*) O valor do PIDDAC de 2008 já não inclui Estradas de Portugal (EP)



(**) Os valores de E.P. foram-nos fornecidos pelo governo na Assembleia República
(***) A taxa de execução do PIDDAC foi calculada utilizando dados constantes do Relatório do OE2006 e do OE2008
A taxa de execução de 2008 é uma previsão feita com base nos anos 2006 e 2007

O PIDDAC de 2008 já não inclui as E.P., mas o de 2006 e 2007 incluía, por isso tivemos de deduzir nos respectivos totais os valores que estavam no PIDDAC relativos às EP fornecidos pelo governo.E quais as conclusões que se tiram a nível de investimentos relativamente ao 2008? O PIDDAC de 2008 é apenas mais elevado em 3,1% do que o de 2007 e é inferior em mais de 12% ao PIDDAC de 2006. E isto em valores nominais, pois se se deduzir o efeito do aumento de preços, o PIDDAC sem a Estradas de Portugal de 2008 é praticamente igual ao de e 2007 , , entre 2006 e 2008, a redução é superior a -19% como mostram os dados do quadro. Portanto, está-se muito longe dos valores que Sócrates e o seu ministro das Finanças pretenderam fazer crer aos portugueses. Outro aspecto importante a referir é a falta de transparência crescente do OE. Efectivamente, ao transformar as EP, numa sociedade anónima retirando assim do âmbito do OE, é assim também retirado ao controlo da Assembleia da República os investimentos em infraestruturas rodoviárias. Falar em transparência e rigor numa situação de crescente desorçamentação, é tornar a transparência e o rigor palavras totalmente vazias e ocas. Em resumo, a declaração de Sócrates, que 2008 seria um ano de viragem no investimento público não corresponde à verdade, mas isso não surpreende, pois a economia não é o seu “forte”. Mas o ministro das Finanças dizer quase o mesmo é que surpreendente e é chocante, pois pode ser encarado como uma tentativa de manipulação da opinião pública. Não será com estas “viragens” que a economia portuguesa conseguirá sair da grave crise em que está mergulhada há já vários anos, nem o País fugir ao atraso crescente relativamente à média comunitária.

Eugénio Rosa
Economista, 15.10.2007
edr@mail.trelepac.pt

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