terça-feira, maio 24, 2005

Não?

O Não de França é sobretudo uma reacção automática e imediata ao ultimato que é este referendo. Reacção a esta coligação da boa consciência, da Europa divina, onde os partidários do sim nunca chegaram a pôr a hipótese de uma derrota. Não é por isso um Não à Europa; é antes un Não ao Sim.

Ninguém suporta a arrogância de uma vitória à priori. As cartas estão lançadas, e a única coisa que nos pedem é um consenso. (...) O Sim não é um sim à Europa, nem a Chirac ou à ordem Liberal. É um sim ao Sim, à ordem consensual.

(..) Este Não profundo não é o resultado de um trabalho "pelo não" ou de um pensamento crítico. É uma resposta em forma de desafio puro e simples a uma tentativa de hegemonia vinda de cima, e onde a vontade do povo é apenas um obstáculo a superar. (...) Não há muito tempo, na Guerra do Iraque, teve lugar uma coligação de todos os poderes contra a vontade expressa, massiça e espectacular da maioria dos povos. A Europa está a fazer exactamente o mesmo, desprezando totalmente a voz dos povos.

Este questão vai muito mais além que um referendo, já que é sintomática dos problemas da democracia representativa, na medida em que as instituições representativas não funcionam no sentido "democrático", dos cidadãos par o poder, mas exactamente ao contrário, do poder para a base, através da armadilha de uma consulta "popular".


Jean Baudrillard, Liberation, 17 de Maio (continua)

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