terça-feira, junho 01, 2004

Carlyle, Carlucci e Cia…

Depois de uma pré-campanha morna ou quase inexistente, a campanha eleitoral para o Parlamento Europeu não parece aquecer muito, apesar do mercúrio que começa a subir nos termómetros. Na falta de confronto de ideias sobre a Europa e o processo constituinte de uma União refundada sobre pilares democráticos, na defesa da paz e dos direitos dos trabalhadores e dos povos, têm-se sucedido os trocadilhos sobre cartões amarelos ou vermelhos e rasteiras como a colagem da direita ao Euro 2004, com a sigla “Força Portugal”. Nas visitas ao nosso distrito, cruzam-se acusações do tipo: “esta obra comecei eu, mas inauguraste tu…” ou “esta inauguraste tu, mas eu é que a acabei…”.

Mas eis que o CDS-PP resolveu deitar um pouco de pólvora na campanha, perguntando com ar ingénuo quem é que paga a “campanha milionária” do BE”? Blasfémia: onde é que já se viu um partido com três deputados dar-se ao luxo de ter outdoors – no nosso distrito, um de grandes dimensões, na rotunda à entrada de Beja e oito mais pequenos, nalgumas sedes de concelho. A pergunta do PP morreria pelo ridículo e nem é preciso entrar em comparações. A resposta óbvia – não é, seguramente, o grupo Carlyle que paga a campanha do Bloco – levou-me a pesquisar alguns dados sobre este grupo que, financiado ou não pela CGD, é candidato à compra de 45% do capital e ao controlo efectivo da Galpenergia; fiquei deveras intrigado com o nervosismo de Durão Barroso, ao chamar mentiroso ao deputado Francisco Louçã, assim em estilo de “agarra que é ladrão…”

Um artigo de Eric Leser, no “Le Monde” de 30 de Abril e que recomendo a quem o puder ler, segue algumas pistas interessantes sobre o “Império Carlyle”: um potentado financeiro de 18 mil milhares de milhões (18 triliões) de dólares que não se encontra cotado em bolsa e só dá contas aos seus 550 investidores milionários ou fundos de pensões. Um grupo discreto, uma sociedade quase secreta que anuncia numa das suas brochuras: “nós investimos em oportunidades criadas nas indústrias fortemente afectadas pelas mudanças de política governamental”.

Para concretizar esta promessa, Carlyle usa informação privilegiada dada pelo “right man in the right place – o homem certo no lugar certo”, pois tem na sua órbita alguns dos mais poderosos do planeta: por exemplo, George Bush pai ocupou durante dez anos, até Outubro de 2003, um posto de conselheiro de Carlyle; e o filho, actual presidente dos EUA, também conhece muito bem o grupo, onde arranjou emprego, em Fevereiro de 1990: enquanto o seu pai era presidente, foi administrador de Caterair, uma sociedade do Texas de restaurantes para a aviação. No dia seguinte ao célebre “discurso da vitória” na guerra do Iraque (já lá vai mais de um ano…), G. W. Bush visitou uma fábrica de armamento da United Defense Industries, um dos principais fornecedores do Pentágono e fabricante do blindado ligeiro Bradley, cujo principal accionista é precisamente… Carlyle. Negócios assim não podem falhar!

Com padrinhos destes, como pode Durão Barroso indignar-se ou sequer corar, quando um deputado levanta legítimas interrogações sobre o eventual favorecimento do único banco ainda 100% estatal – a Caixa Geral de Depósitos – a um consórcio liderado por Carlyle? No seu íntimo, Durão Barroso devia até estar orgulhoso por seguir as pisadas de gente tão importante… No círculo de notáveis de Carlyle figuram nomes como John Major, ex-primeiro-ministro britânico; Fidel Ramos, ex-presidente das Filipinas; Park Tae Joon, antigo primeiro ministro da Coreia do Sul; o príncipe saudita Al-Walid; Colin Powell e James Baker, o actual e um antigo secretário de Estado; Caspar Weisenberger; o milionário George Soros e até membros da família Bin Laden…

Um nome, porém, se destaca pelas suas ligações a Portugal: Frank Carlucci tornou-se director-geral de Carlyle a 6 de Janeiro de 1989, seis dias depois de, oficialmente, ter deixado o Pentágono. No currículo deste ex-director da CIA consta o lugar de embaixador em Lisboa, em 1975, no ex-Congo belga durante o assassinato de Patrice Lumumba e no Brasil após o golpe dos generais. Há dias, Martins da Cruz, antigo MNE, amigo pessoal e homem de confiança de Durão Barroso, indignava-se com Francisco Louçã, afirmando que o Portugal nem sabe o que deve a Carlucci… Fiquei curioso. E alguém ainda se admira que um dos mais poderosos lobbies do mundo, o grupo Carlyle, ande a “mexer os seus pauzinhos” para controlar a Galpenergia? A 13 de Junho, os eleitores têm uma boa oportunidade de dar a sua resposta a toda esta “grande companhia”…

Alberto Matos (Radio Pax)

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