Carga policial em Saragoça e Barcelona
Sigo para Lavapiés, o subúrbio de onde partiu um dos comboios. Ali a praça está vazia, mas quando chego à calle Cabeza, uma rapariga de repente abre
a porta e com a cabeça erguida desafiadoramente, começa a bater numa panela.
Os vizinhos, primeiro timidamente, chegam às janelas mas rapidamente começam também a usar as panelas como bombos. Primeiro é uma batida suave, mas em poucos minutos todo o bairro ressoa com um ruído ensurdecedor. As pessoas saem para a rua e juntam-se na praça, que velozmente se enche de pessoas que zurzem as panelas, as frigideiras com toda a força.
Aparece uma câmara de televisão alemã, e entretanto toda a praça e ruas adjacentes estão cheias de gente protestando sem palavras e há um instante fantástico em que parece que todos seguem o mesmo ritmo. Um ritmo fúnebre e contundente, seco, duro, cheio de raiva e de solenidade. E começa a marcha em direcção à Praça Sol onde nem sequer se consegue entrar, porque toda a Madrid está na rua.
Continuam a voar as notícias, multiplicam-se as mensagens de solidariedade através dos protestos nas outras cidades. A polícia carrega contra manifestantes em Saragoça e Barcelona. Escuta-se que há a hipótese de suspender as eleições. Surgiu nas mãos do PP, de repente, um vídeo da Al-Qaeda reivindicando o atentado, as pessoas comentam espantadas e indignadas que a televisão espanhola continua a ignorar a manifestação.
A cadeia SER diz que, apesar de as ruas estarem cheias de manifestantes, não vão continuar a transmitir para manter a calma e não acirrar os ânimos:
é a censura do século XXI.
As câmaras, os microfones e as luzes desaparecem. Só ficam os jornalistas alemães mas os manifestantes mantêm-se firmes, gritando, em todas as ruas que conduzem à Praça Sol, completamente repletas. Não há bandeiras, nem partidos, nem megafones, nem organizadores, nem ordens. A multidão avança espontaneamente desde Atocha, a polícia retira-se discretamente.
Os manifestantes invadem todas as ruas, cortando o trânsito e, embora caminhem por onde querem, ninguém parte vidros, não há um gesto sequer de destruição.
Madrid avança civicamente e o ministro Ansuátegui ordena a invisibilidade: A polícia apaga as sirenes e carros de choque mal se distinguem.
"Venham connosco", o grito dirige-se à polícia e muitos viram a cara e baixam os olhos, sem conseguir encarar os que passam.
Regressam os gritos exigindo informação do governo, que este assuma a responsabilidade e deixe de mentir ao país que, através da Internet e dos telemóveis, está em contacto com o mundo inteiro. As pessoas ligam os portáteis e deixam que, do outro lado, os interlocutores oiçam o ambiente da manifestação. A imprensa espanhola, em especial a televisão, não protesta ordem de silêncio, deixando claro de que lado está.
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