Carta aberta a um ministro esquecido - 1ª parte
Alguém sabe do nome do homem? Alguém se lembra? Não? Já passou tempo desde a foto de família nos jardins de S. Bento, e de lá a esta parte, com ou sem problemas de fósforo no cérebro, eu
pelo menos eu
admito: esqueci-lhe o nome. Talvez seja melhor perguntá-lo a si directamente, como seja:
– Vai desculpar a pergunta: como raios é que o senhor se chama?
Eu tenho que sabê-lo – quanto mais não seja por curiosidade – e como eu, tantos outros quererão também lembrar-se de si. E aproveite: não é todos os dias que alguém se lembra de nós, que por nós mostra algum interesse. Ou que se lembre apenas que deveria lembrar-se. Como aquela data de aniversário que é hoje e não sabemos a quem corresponde, olhando para o telefone sem sabermos a quem ligar.
E congratule-se portanto. Eu sei ao menos que o que não me lembra é o seu nome – se eu tivesse o seu número de telefone, acredite: ligava-lhe. Só para saber o que é feito de si. Como tem andado, se já teve tempo de ir à Trindade assistir ao Viriato – ou ao que o outro decidiu fazer dele.
Isto que lhe digo é, na minha modesta opinião, algo bom. Alguém lembrar-se de si. Seria exagerar clamá-lo como um bom motivo para vestir outra vez a gravata e fazer uma aparição na TV, às oito da noite no telejornal, quanto mais não fosse para anunciar:
– Caros concidadão, muito boa noite, o meu nome é tanto-e-tal e sou, para os que ainda têm dúvidas, o Ministro da Cultura deste governo.
É que não se lhe recorda qualquer aparição pública ou intervenção, exceptuando talvez a sua visita oficial a Timor, na companhia de Martins da Cruz e a quem doou, talvez por altruísmo ou bondade, todo o destaque na acção que protagonizaram. Mas destas coisas há sempre gente a esquecer-se. Ingratidão, talvez. E em momentos como estes, quando já passou algum tempo, devem sempre falar de nós. Bem ou mal. Já a outra o dizia. E eu sei lá. Vá à televisão dizer por exemplo que não concorda nada que a hora não mude no equinócio de outubro, que fique igual à dos espanhóis, nuestros hermanos – e do resto da Europa também, convém dizer.
Porque eu sei, ou imagino, o quão frustrado o senhor andará, ou atreveria mesmo dizer deprimido. A si ninguém lhe dá nem 15 segundos de tempo de antena. Ninguém o envolve em polémica nenhuma, ninguém exige a sua cabeça demissionária, nem sequer lhe pedem a sua opinião.
Ora a sua opinião é com certeza tão boa como qualquer outra. Talvez até o venham a contratar como comentador. Se num dos canais está o Carrilho, noutro bem poderia estar o senhor, e um Ministro da Cultura é sempre um Ministro da Cultura.
Faça alguma coisa. Aconteça alguma coisa.
Venha para as televisões dizer que deveríamos passar a ser uma região autónoma de Espanha. Um único país ibérico, com um muito maior poder económico. Mas não esqueça uma gravata amarela à cabeça, como uma espécie de Rambo extemporâneo, preparado para o derradeiro combate, ou para concorrer ao cargo de governador de um país qualquer.
Proponha que o nome do seu ministério passe a Ministério do Entretenimento. Inédito em toda a Europa! Já que dizem que andamos sempre na cauda, fazia-se logo aí da cauda uma cabeça e tudo mudaria de figura, e não seria mal pensado de todo. Revista no D. Carlos, concertos populares all night long no D. Maria II, novelas na RTP1 e BBC Vida Selvagem na RTP2. Mais coisa menos coisa. E com a falta de espaço que há em Lisboa – com o resto do país não tem que preocupar-se – tenho a certeza que o amigo Santana iria agradecer, pois logo se lembraria de como reabilitar todos os demais teatros, entretanto fechados para obras. Mas assegure bem o contrato que faz, não vão querer o LaFéria no cargo, ele capaz até de transformar a Assembleia da República num espectáculo de sucesso, com giras de norte a sul e tudo o mais – e toda a gente sabe que não há paciência para aturar uma sessão plenária até ao fim.
Eduardo César
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