Geopolítica da Fome
Jacques BERTHELOT
7 de Maio de 2003
Persistência da fome no mundo e carência democrática
A existência de fome no mundo é paradoxal, já que existem enormes excedentes agrícolas (tanto nos produtos “temperados” como nos “tropicais”). Segundo a FAO, 840 milhões de pessoas estão num estado de subnutrição crónica.
Em relação ao total de população de cada Continente, a africa Sub-sariana é claramente à frente, com 34%, seguida da Ásia do Sul (24%), América central (19%) e China (9%). Apesar do número de pessoas com fome ter diminuído nos países em desenvolvimento para a metade entre 1969-71 (37%) e hoje (18%), este número não diminui mas aumentou na África em mais de 90% !
O objectivo da cimeira mundial da alimentação (1996, confirmada em 2002) de reduzir para metade este número até 2015 nunca será atingido, já que o decréscimo das pessoas com fome deveria ser de 20 milhões por ano, sendo actualmente de 2 milhões por ano.
A fome não resulta (como muitos querem fazer crer) de uma falta de recursos naturais (terras, água) ou financeiras, mesmo com a má repartição actual da riqueza; a produção agrícola também não é a origem da fome, já que aumentou mais que a população humana nos anos 90 (2% para 1,5%).
¾ das pessoas com fome vivem no mundo rural, sendo essencialmente agricultores: a fome resulta de uma insuficiência democrática, da não participação dos agricultores nos objectivos e nas políticas agrícolas a nível local, nacional, macro-regional e mundial.
Liberalização das políticas agrícolas e desmantelamento das protecções à importação.
Depois da globalização neo-liberal encetada nos anos 80, em crescente aceleração depois de 1995 com os diferentes acordos da OMC, nomeadamente o que se refere à agricultura, a persistência da fome ou mesmo os eu aumento em África são explicadas essencialmente pelo desmantelamento das protecções à importação.
Por exemplo no México, depois do estreitamento comercial com os EUA, desapareceram 1,8 milhões de agricultores, já que o milho americano (cujos subsídios implicam que um agricultor Americano receba 30 vezes mais que um agricultor Mexicano) é exportado a 90 $ a tonelada quando o seu custo de produção é de 134 $ a tonelada! Os mexicanos foram assim duplamente penalizados: individualmente, receberam muito menos pelo seu produto e mesmo assim, o milho produzido deixou de ser “competitivo” no mercado. O México passou assim de produtor a importador, essencialmente por causa de mecanismos proteccionistas que de “mercado livre” ou “livre” têm muito pouco.....
A UE (União Europeia) faz exactamente o mesmo com os países Africanos. São assim postos em “livre concorrência” agricultores Europeus que recebem 54000 euros de ajudas directas e Agricultores Africanos que não recebem nada; qual é que é vantagem destes últimos na livre concorrência? até onde é que a hipocrisia dos países mais ricos pode chegar?
Esta liberalização das políticas agrícolas, nomeadamente a redução das limitações à importação é muito recente. Dada a especificidade dos mercados agrícolas e a sua muti-funcionalidade, afectando o ambiente, as paisagens, o emprego, o ordenamento do território, a qualidade dos produtos, a seguranças alimentar, o bem-estar animal, todos os países desde o tempo dos Faraós têm políticas específicas para regular a oferta agrícola. Porque é que então houve um abandono destas políticas, sujeitando os produtos agrícolas aos mercados mundiais, como se fossem mercadorias ordinárias?
(continua quando tiver mais tempo para traduzir, resumir e adaptar)
PP
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