quinta-feira, setembro 23, 2004

O Fim do Mundo?

Entrevista a Urbano Tavares Rodrigues, em Outras Palavras


O senhor acaba de lançar no Brasil “O espaço e o tempo em que vivi”, seu livro de memórias. Qual a sua avaliação do tempo em que vivemos hoje?

Na minha opinião, a humanidade vive a maior crise da sua história, mais profunda e complexa que aquela que assinalou o fim do Império Romano. É simultaneamente económica, financeira, militar, política e ambiental. A sua causa é um sistema de poder com características inéditas, hegemonizado pelos Estados Unidos, que retomaram o sonho antiquíssimo do Estado universal, mas com a ambição de ser perpétuo. Isso representa uma ameaça que põe em perigo a própria continuidade da vida na Terra. Apesar de serem uma nação muito poderosa militarmente e a primeira potência económica, os Estados Unidos tornaram-se uma nação parasita. É um país que consome muito mais do que produz. Há vários anos que a sua balança comercial é negativa. O déficite de junho, por exemplo, é cerca de 45 mil milhões de dólares. A sua dívida externa é maior do que a de todas as nações somadas. A interna é também assustadora: corresponde a 85% do seu Produto Interno Bruto. (...)

Qual a alternativa, diante de um poder que tem fragilidades, mas se mostra imbatível?

Há duas posições diferentes. Uma delas é a que se vê nos Fóruns Sociais Mundiais. O inimigo é muito poderoso, não temos condições de destruí-lo, então vemos se o reformamos, se conseguimos humanizá-lo. Enquanto isso, vamos buscando uma alternativa teórica à globalização, vamos pensar a reforma da democracia e possivelmente um socialismo de novo tipo. Isso parece o mais razoável -- mas é utópico, porque não se conseguirá nunca formular uma alternativa teórica que seja aceita universalmente. A solução do futuro para um país como o Brasil não será a mesma para o Canadá ou a Tailândia.

A outra posição sustenta que, como não podemos cair no teoricismo, temos que nos mobilizar contra o inimigo que é frágil, embora oculte suas fraquezas. Eu penso que o caminho é esse: o da mobilização dos povos contra a ameaça à humanidade, até porque o sistema de poder dos Estados Unidos, pelo seu amoralismo, só encontra precedente no Reich nazista, como mostraram os crimes cometidos no Iraque e no Afeganistão pelo exército norte-americano.

Pelo que o senhor diz, a posição maioritária no Fórum Social Mundial está equivocada...

Os fóruns sociais, o mundial ou os regionais, são espaços de diálogo insubstituíveis, nos quais os movimentos sociais tiveram um papel decisivo na mobilização. Contudo, há limites. É certo que uma organização revolucionária de novo tipo só se definirá no decurso da luta, porque hoje a maioria dos partidos comunistas apodreceu – na Europa, há dois que se mantêm fiéis a certos princípios, na Grécia e em Portugal. Entretanto, há uma tendência muito visível de voltar o debate a questões que acabam por ser inócuas. Há um movimento neoanarquista, que tem à sua frente intelectuais como John Holloway e Toni Negri, que é desmobilizador. Um exemplo é o zapatismo, cuja teoria se expressa numa frase: “sou um rebelde, mas não sou um revolucionário”. O subcomandante Marcos é um intelectual brilhante, mas não ameaça o sistema. Os movimentos são importantíssimos e indispensáveis, porém não substituirão a capacidade de mobilização permanente da organização revolucionária.

Leia a entrevista completa, por Rita Casaro

Pois, eu é mais "Viva Zapata", mesmo que já não seja com aquela pureza revolucionária que reclama Urbano Tavares Rodrigues...

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