quarta-feira, agosto 06, 2008

Dirigente sindical reivindica retirada das tropas do Haiti


Dirigente sindical vem ao Brasil reivindicar retirada das tropas do Haiti

Fonte: Agência Petroleira de Notícias

Em visita ao Brasil, o dirigente da central sindical Bataille Ovrière, Didier Dominique, denuncia desrespeito aos direitos humanos, praticados pelas tropas da ONU, e articula apoios pela retirada da chamada "força de paz" do território haitiano. Acompanhado de dirigentes da Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas), Dominique entregou um dossiê, com graves relatos, à Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no Rio. Em Brasília, buscará apoios junto ao parlamento para que a missão da ONU, liderada pelo Brasil, não seja renovada. O prazo de permanência das tropas internacionais no Haiti se esgota em Outubro.

Dominique diz que, há quatro anos, o povo do Haiti ainda se iludia, acreditando que a presença das tropas da ONU, em especial do Brasil, poderia trazer benefícios. Segundo afirma, hoje está claro que a ocupação militar do Haiti, além de aviltar a soberania daquela nação, é um ato de solidariedade aos interesses das multinacionais, sobretudo do setor têxtil. Ele conclui que os militares não estão lá para proteger a população:

"O filho do vice-presidente José Alencar, que é empresário do setor têxtil, esteve no Haiti. Várias marcas, como Levis, Nike, estão disputando a instalação de fábricas numa zona franca, para aproveitar a mão-de-obra mais barata das Américas. Um operário haitiano custa, em média um dólar e setenta e cinco centavos por dia. Penso que a situação de miséria extrema a que o nosso povo está sendo submetido é proposital, para favorecer os interesses das empresas, forçando o trabalhador a aceitar qualquer pagamento" avalia Dominique.

Arquiteto e professor universitário, Dominique considera que a intervenção no Haiti passará a história como uma mancha na biografia de governantes que se elegeram com o apoio de movimentos populares, como o presidente Lula. No dossiê que entregou à OAB existem relatos de abuso sexual de mulheres e meninas por soldados brasileiros, repressão a movimentos sociais, com registro de feridos e mortos:

"Numa das últimas manifestações, quando o povo se rebelou contra a fome, morreram sete pessoas e várias ficaram feridas, em decorrência da repressão militar. Temos tudo documentado, com as circunstâncias e os nomes das vítimas" contou Dominique ao conselheiro da OAB e secretário da Comissão de Direitos Humanos, Carlos Augusto Coimbra de Mello. O advogado se comprometeu a fazer um relatório que encaminhará à Brasília, sugerindo uma ação junto ao Senado.

Dominique já manteve contato com o senador Eduardo Suplicy, onde encontrou alguma receptividade, embora com outras lideranças do PT, partido do presidente da República, os contatos tenham dado poucos resultados práticos: "Já me reuni até com representantes do Ministério das Relações Exteriores. Ouvi promessas, mas não houve desdobramentos" afirma.

O dirigente sindical guiou uma delegação de sindicalistas e ativistas de movimentos de esquerda brasileiros numa visita ao Haiti. Um deles, o advogado Aderson Bussinger, da Conlutas, conta o que viu:

"A miséria é extrema. Não há luz, a água é escassa, falta comida, não há coleta de lixo. E não vi uma única escola, um único posto de saúde, que tenha sido construído pela missão da ONU. É apenas uma missão militarizada. Afinal, que tipo de solidariedade é essa?"

"São 200 anos de opressão"

O Haiti foi o segundo país das Américas a proclamar a independência, em 1804, e o único na história da humanidade e realizar uma revolução de escravos vitoriosa. Do território haitiano saíram revolucionários como Bolívar e José Marti para libertar os países latino-americanos do jugo espanhol.

Mas o Haiti saiu destroçado da guerra pela independência. Por pressão dos Estados Unidos, que era escravista, não foi reconhecido como nação livre, em 1825, no primeiro encontro realizado entre os novos países americanos. Até o final da guerra de secessão norte-americana, em 1864, foram 60 anos de boicote econômico.

Ao longo de 200 anos, a incipiente economia haitiana foi sempre massacrada por interesses do capital externo. A história registra a intervenção de ingleses, alemães, estadunidenses. Tudo isso resultando numa enorme instabilidade social e inúmeros golpes de estado.

O povo segue em busca de soberania e paz social mas, afirma Dominique, "não é a paz de cemitério, paz de matança, proporcionada pelas tropas intervencionistas da ONU e, infelizmente, lideradas pelo Brasil, o país mais admirado no Haiti, sobretudo por seu futebol. Temos laços culturais, mas não estamos de acordo com a ocupação que nos mata".


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2 comentários:

Gnóstico disse...

Sem negar que possam existir interesses menos claros no meio desta situação mas a situação do país antes da intervenção internacional não era de uma sangrenta guerra civil?

A única pergunta que devemos faze é se existem condições no terreno para aumentar o grau de autonomia local.

Anónimo disse...

Gnóstico, é verdade, mas também é verdade que alguns dos que apelaram a uma intervenção internacional foram dos que mais contribuíram para que ela fosse necessária.

A tua pergunta não é a única que devemos fazer mas é uma das que devemos fazer. Sem sombra de dúvidas.