sábado, outubro 13, 2007

Casa Pia:Finalmente a Normalidade

Finalmente a normalidade,
POR ANTONIO DORES

Por palavras semelhantes àquelas proferidas pela actual Provedora da Casa Pia o Provedor ao tempo do rebentamento do escândalo da descoberta de uma indústria de abusos sexuais foi exonerado de funções. Disse a senhora Provedora fazer o que lhe é possível – e não mais – para evitar abusos e, por isso, entende que todas as denúncias públicas de situações de que não tenha conhecimento apenas perturbam o melhor funcionamento da instituição. Isto no mesmo dia em que a organização dos representantes dos funcionários da mesma instituição vem denunciar o inferno que terá sido o período de vigência da Provedora escolhida para apanhar com o escândalo.
Quando rebentou o escândalo público – ou melhor: quando foram dados à estampa nomes conhecidos envolvidos pelo Ministério Público no assunto – houve quem reclamasse da demência geral, da excitação desproporcionada, do moralismo e do judicialismo.
Pessoalmente acompanho estas últimas duas queixas, mas não as primeiras. A indignação, a repugnância, a revolta são salutares perante a ignomínia e o abuso. Exigem reflexão normativa e moral, o que é uma coisa boa. Sem dogmas e preconceitos: aí estou de acordo. Entregar a coisa a especialistas (magistrados e advogados), ainda por cima quando toda a gente sabe que são incapazes, por sistema, de realizar os objectivos da sua missão colectiva, um dos pilares (em falta) da democracia, foi um erro grave das massas de portugueses que ficaram enojados e desorientados durante muitos meses. O pior que se fez foi resumir o assunto a um processo judicial, omitindo responsabilidades políticas que, principalmente à esquerda (a direita tem mais pudor, parece), se pretendem branquear, como se fosse coisa boa esconder a lama debaixo da alcatifa. (claro que a alcatifa cheira mal!).
Os escândalos são óptimas oportunidades para conhecermos melhor a natureza das coisas e das pessoas, incluindo nós próprios, e testar a capacidade de intervenção das instituições morais e judiciais. Nesse sentido, que lições se pode dizer que aprendemos colectivamente? Na boca da actual Provedora, absolutamente nada. Os mais altos responsáveis (acompanhados pelos representantes dos funcionários) da Casa Pia – após um interregno manifestamente doloroso para eles (são insensíveis a dores alheias) – querem a normalidade, uma esponja sobre assuntos desagradáveis cuja memória ou recordatória impede que continuem a sua “missão educativa”(?).
Ele houve psicólogos que se inquietaram com o sofrimento das crianças e foram perseguidos por isso (recebam a minha solidariedade!). Ele houve psicólogos empenhados em explicar que acontece nas vidas plebeias momentos de excitação descontrolada, mas que essas coisas sempre acabam por acalmar. Não houve perseguição destes últimos, até porque parece que têm razão. Os senhores ainda são senhores e os meninos e meninas da Casa Pia continuam desprotegidos.

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