Como os governantes russos alimentaram, após o fim da União Soviéita, as forças políticas mais retrógradas da Tchechénia, que agora intensificam o terror.
Juan Pablo Duch, La Jornada
Separatismo, petróleo, extremismo religioso, ressentimentos antigos, interesses geopolíticos estrangeiros e luta entre clãs pelo poder misturam-se, entre outros fatores, no conflito da Tchechénia, cujas raízes são anteriores à desintegração da União Soviética. De facto, elas remontam à épóca em que os czares decidiram conquistar a estratégica região do Cáucaso Norte, no século XVIII, quando o xeque Mansur reuniu um exército de montanheses para fazer frente ao império russo.
A partir deste momento - e já se passaram 219 anos desde esse levantamento armado - o sonho da independência Tchechena tem sido constante na sua difícil convivência com os russos.
Talvez a página mais dolorosa do período soviético foi a brutal deportação ordenada por Estalin, em 1944, para terras inóspitas do Kazaquistão, na Ásia Central, que custou a vida de quase 200 mil Tchechenos.
No seu confronto com Mikhail Gorbachev, o ex-presidente da Rússia Boris Yeltsin, que não deixou de aproveitar para dar apoio a todo foco de tensão no vasto território soviético para desestabilizar o seu rival, colocou o general Dzhojar Dudayev no poder na Tchechénia.
O colapso soviético criou as condições propícias para que o governo de Dudayev proclamasse a sua independência, em 1991, que Yeltsin tentou abafar três anos depois através da força. A primeira guerra russo-chechena terminou em 1996 com a virtual capitulação russa, expressa na vergonhosa assinatira dos acordos de Jasaviurt.
Dudayev foi asssasinado, mas as ideias separatistas seguiram prevalecendo entre os novos líderes, ainda que um caminho mais moderado e pragmático tenha sido escolhido pelo presidente Aslan Masjadov, que buscava fortalecer o estado Tchecheno através do reconhecimento russo à independência baseado nos termos do acordo de Jasaviurt.
Masjadov fracassou e não pode evitar que a Tchechéia, no fundo uma sociedade tribal e estruturadas em clãs e vínculos familiares, acabasse dividida num sem-número de pequenos feudos, cujos caciques se dedicavam a saquear o petróleo e outras riquezas.
A divisão entre os separatistas ficou evidente quando o sector mais radical, representado por Shamil Basayev, buscou apoio no exterior e converteu-se no principal defensor das ideias do wahabismo, uma visão fundamentalista do Islão, estranha à maioria dos Tchechenos.
A diferença principal entre os moderados e os radicais foi a convicção dos últimos de que a luta contra o "imperialismo russo" deveria prosseguir apesar dos acordos de paz, para fazer da Thechénia não apenas um país independente, mas um exemplo do movimento de todo o Cáucaso Norte.
Com um Yeltsin cada vez mais doente e distante da realidade e Masjadov e Basayev seguiam discutindo na Tchechénia floresceu todo tipo de contrabando e o sequestro de pessoas ricas no território russo transformou-se no principal modo de sobrevivência dos paramilitares que exerciam o poder de fato nos diferentes feudos - diante da ausência de lideranças em Moscovo e Grozny capazes de cortar pela raíz estes fenómenos que só serviam para opor a sociedade russa aos Tchechenos, que passaram a ser confundidos com a máfia.
O sucessor de Yeltsin, Vladimir Putin, então um desconhecido para a maioria dos russos, chegou ao Kremlin depois de prometer acabar com o problema Tchecheno "perseguindo os terroristas".
Antes disso, em agosto de 1999, Basayev invadira um pequeno povoado que proclamou a "República Wahabita Independente", de vida abreviada pela intervenção do exército russo.
Em setembro do mesmo ano, explosões ainda não esclarecidas derrubaram vários prédios em Moscovo e outras cidades russas, causando a morte de centenas de pessoas e criando um ambiente de ódio aos Tchechenos, acusados pela equipa de campanha de Putin de estar por trás dos atentados.
Publicado em www.planetaportoalegre.net: 08/09/2004
(continua em baixo)
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