terça-feira, abril 27, 2004

Falta de autonomia

Regressado de férias, li ontem o novo modelo de financiamento das unidades de investigação proposto pelo Ministério da Ciência.

Tem-se falado muito do célebre subsídio especial a investigadores com mais de 100 artigos publicados. Isso, no entanto, é de somenos importância (porque afeta muito pouca gente!!!) quando comparado com o resto desse documento.

O que choca na política científica, que presumivelmente deveria ser liberal e pró-competição, do atual governo, é o ser continuado e REFORÇADO quadro bur(r)ocrático. Vai deixar de haver "financiamento programático" - o que quer dizer que as unidades de investigação "normais" (que não os ultra-selectos - e escolhidos por cunha - laboratórios associados) não vão poder contratar doutorados nem estudantes de doutoramento. Os salários e subsídios, naturalmente, continuarão padronizados, tal como as universidades e as unidades de investigação. Um professor catedrático no Instituto Superior Técnico continuará a ganhar o mesmo que um professor catedrático da Universidade da Beira Interior - apesar de os níveis de exigência serem muito diferentes, e de o custo de uma casa em Lisboa ser o dobro do custo de uma casa na Covilhã. As bolsas continuarão a ser sempre as mesmas e, naturalmente, para favorecer a fuga de cérebros, continuará a pagar-se 50% mais a quem faça o seu doutoramento ou pós-doutoramento no estrangeiro do que a quem o faça cá. Há ainda, para acrescentar uma pinta de chauvinismo, uma referência a subsídios 100% superiores quando o investigador que se radica em Portugal é português - porque é que, senhores, um investigador PORTUGUÊS (seja lá o que isso seja...) há-de ter direito a maior subsídio do que um investigador estrangeiro???

E continua a falácia das "contratações". Que contratações serão essas? A prazo, está bem de ver. Os investigadores e docentes em Portugal continuarão a ser, na sua imensa maioria, contratados a prazo. Muitos deles sem terem direito a subsídio de desemprego. Muitos outros não descontam para a reforma, e têm apenas um seguro de saúde privado, que os discrimina fortemente no caso de terem qualquer verdadeira doença. Isto é que são as "contratações" de doutorados que o governo português
está disposto a continuar a oferecer.

Concorrência e liberalismo, precisam-se. Mas a sério.

Luís Lavoura

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