Atraída por vantagens materiais, parte da comunidade científica faz das pesquisas um meio para aumentar o fosso entre ricos e pobres. Para travar a mercantilização do saber, é preciso proibir as patentes sobre a vida.
Rafael Evangelista
Na Índia, a ONG Research Foundation for Science, Technology and Ecology (Fundação para a Pesquisa em Ciência, Tecnologia e Ecologia), cujo líder é a física e activista Vandana Shiva, trava uma dura batalha judicial para fazer com que o seu país conteste a patente concedida à Monsanto relativa ao trigo indiano. A disputa é mais um caso emblemático de biopirataria, um termo criado pela própria Shiva para designar a nova modalidade de roubo colonial feito pelos países do Norte sobre os países do Sul. Os agentes dessa empreitada são as multinacionais de biotecnologia. Mas só podem fazer isso usando, como parceira, parte da comunidade científica.
Aproveitando-se da imagem favorável que a ciência e a classe científica, em geral, gozam no mundo, as multinacionais foram hábeis ao integrar boa parte de ambas, de maneira direta ou indireta, nos seus quadros. O instrumento principal utilizado para isso foram as patentes, principalmente as patentes sobre organismos vivos. Há quase dez anos, firmou-se na Organização Mundial do Comércio (OMC) o acordo TRIPS (Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights, Acordo para o Comércio de Propriedade Intelectual). Este acordo abriu um espaço para que os países regulamentassem as patentes sobre a vida e estabeleceu um duro sistema de controlo da produção científica em escala mundial. Esse controlo permitiu à indústria tecnológica uma explosão das suas margens de lucro.
O que se viu, na verdade, foi o desenvolvimento de um cenário polarizado. De um lado, prémios oferecidos ao desenvolvimento de certas linhas de pesquisa, enriquecimento rápido de uma nova classe de pesquisadores-empresários, lucros gigantescos gerados pelo patente sobre plantas. Do outro: a crescente desconfiança relativamente à segurança de certos alimentos, contratos leoninos que empobrecem pequenos agricultores, longos e custosos processos em tribunais internacionais, desrespeito da opinião pública, lacunas na informação passada aos consumidores.
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