Como afirmei anteriormente (aqui, aqui e aqui), vender a companhia das Lezírias é uma atitude criminosa, que lesa o interesse comum de Portugal. Por isso, estou completamente de acordo com o editorial de Manuel Carvalho, hoje no Público:
A anunciada reprivatização da Companhia das Lezírias é uma operação que, à partida, oferece inúmeros dúvidas e uma única certeza: os 20 mil hectares de zona agrícola e florestal que até agora têm funcionado como tampão à especulação imobiliária na área da grande Lisboa vão ficar sob séria ameaça. Durante dois anos, a ministra Manuela Ferreira Leite andou a vender "pechisbeque" para arrecadar receitas extraordinárias, mas, ao anunciar a reprivatização das Lezírias, mostra-se pronta a prescindir de uma pedra preciosa do património do Estado. Porque a companhia é lucrativa, porque jamais gerará um encaixe significativo para abater a dívida pública (as avaliações conhecidas apontam para a ordem dos 100 milhões de euros) e porque, ao desviar para a esfera privada um património ambiental e agrícola de grande sensibilidade, o Governo abre portas à especulação imobiliária numa área que foi resistindo à expansão urbana descontrolada.
Os interesses são muitos e alguns exemplos conhecidos. Os sucessivos Governos bem tentaram travar a apetência dos construtores pelas zonas de montado da margem sul do Tejo, aumentando por lei, por exemplo, o valor das coimas. O resultado está à vista: é compensador violar a lei, pagar as multas e avançar com lucrativas operações de promoção imobiliária. Desse triste destino foi igualmente alvo a Companhia das Lezírias, que, através de um negócio sobre o qual se fez um silêncio ensurdecedor, se viu desapossada, entre 1990 e 1996, de 507 hectares de montado de sobro, a poucos quilómetros da Ponte de Vasco da Gama, vendidos na época a 78 escudos o metro quadrado! Que não nos venha agora o Governo apaziguar os receios com promessas de planos de ordenamento, com "golden shares" ou com outro qualquer plano bem intencionado para defender o património da Companhia: se nem o Estado foi capaz de defender a sua integridade, não se queira que sejam os interesses privados a fazê-lo.
Poderíamos acreditar nesta possibilidade se se vislumbrasse no depauperado sector agrícola nacional alguém com pelo menos 100 milhões de euros para concorrer à privatização. Mas não há. O único desfecho possível para a Companhia é, portanto, aquele que o anterior Governo do PS lhe atribuiu: mantê-la na esfera pública e fazer da sua gestão um exemplo de boas práticas agrícolas. Ou então persistir na concessão de pequenos lotes de terra para jovens agricultores, como se fez no Governo de Cavaco Silva.
Desde que se iniciaram o estudos para uma eventual privatização das Lezírias, as dúvidas suplantaram as certezas e sobrou sempre bom senso para travar os apetites vorazes que as suas terras suscitaram aos construtores e promotores turísticos e imobiliários. Espera-se agora que o Governo encare melhor o problema e chegue às mesmas conclusões. Se se aceita que a ministra venda "pechisbeque", como disse repetidamente, não se lhe pode admitir que venda jóias como as lezírias do Tejo.
100% de acordo!
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