2ª parte (tirado daqui)
Naquele momento soubemos de uma vez por todas que o nosso só terá saída se formos capazes de agarrar o futuro com as nossas mãos. Que são as nossas mãos nuas o único instrumento com que contamos para sermos alguém. Que nada podemos esperar de uns políticos mentirosos e falsários que nem se atreviam a vir, porque além disso são cobardes e estúpidos.
E comprovamos com tristeza mas com orgulho como soavam mais de duzentas mil vozes a coro no Obradoiro; como se uniam as mãos das crianças galegas para encadear esta tragédia com um futuro mais esperançoso… Como crescia a indignação enquanto se descobria a indignidade que os cobria e os cobrirá. Como as janelas e varandas se enchiam de berros em branco e negro, enquanto o seu coração remoía ódio e rancor ao contemplar que não aparecia em nenhum lado a resignação e a submissão que esperavam.
E assim, aprendizagem após aprendizagem, fomos construindo uma experiência nova, que vale tanto como dizer, um conhecimento da realidade que nos aproxime um pouco a fazermo-nos donos do nosso futuro. A dizer-lhes que não podemos confiar em ninguém senão em nós mesmos, porque nos demonstraram que nos desprezam tanto quanto são capazes, como de facto fizeram, de insultar e blasfemar impunemente. Dizer-lhes que sabemos que no fundo sabem como de grande foi o nosso sofrimento, mas ignoram como é grande agora o nosso conhecimento. Provocaram-nos um grande dano, mas proporcionaram-nos o poder de enxergar o caminho da sabedoria: os sábios são livres.
Também nos deixaram um rosário de tristes palavras: "fiozinhos de plasticina", "fuel que se converterá em pedra", "só sabemos que não sabemos"… E outras pérolas das quais só quero destacar mais uma: "cães que ladram nas esquinas", porque na Costa da Morte se diz que os cães que ladram em vésperas de Natal fazem isso para avisar que chegam os esbirros de Herodes para degolar os inocentes.
Haverá quem me diga que não aprecia tais aprendizagens na realidade de hoje, mas quero dizer a quem assim o pense, que as mudanças que se produzem nos corações demoram para se manifestar na sociedade. Por isso me atrevo agora a dizer que faz um ano que começou para muitíssimos galegos um tempo novo e, com a sua força, já NUNCA MAIS nada vai ser como antes.
Xabier P. Docampo
Novembro 2003
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