Contradição
Libération, 10 de Novembro, por Antoine Gaudemar
Podemos adivinhar facilmente porque é que o movimento altermundialista fascina os partidos políticos, tornando-os obsequiosos para com o movimento.
Vítimas de uma crise existencial agravada pela surpresa do recente voto em Le Pen, assistem, um pouco desconcertados, à efervescência espectacular de um universo militante novo e atípico, apartidário e sem fronteiras; que, das manifestações aos Fóruns sociais, de Seattle a Florença, passando por Larzac [e Porto Alegre] drena sempre multidões impressionantes. E que emana uma generosidade e um entusiasmo impar, exactamente o que falta aos partidos tradicionais e que leva ao afastamento de cada vez mais militantes.
Muitos dos militantes "alter" são pessoas decepcionadas de toda a esquerda, socialistas, comunistas, verdes, extrema esquerda, e a sua decepção levou à criação deste espaço político desconhecido há dez anos, simultaneamente radical e festivo, idealista e pragmático, através do tecido associativo que o constitui.
Em poucos anos, graças a uma hábil e moderna estratégia, alternando a organização em rede com encontros de massas [ex. FSM ou FSE e as muitas manifestações], os altermundialistas impuseram à classe política ocidental os seus temas e as suas demandas. Ao ponto de estarem hoje ameaçadas por uma crise de crescimento, à imagem da ATTAC (associação farol deste movimento), onde a ética política não se afasta muito dos tiques de retórica [dos partidos políticos], ao mostrar-se dogmática e com falta de democracia interna. Por isso, apesar de muitos não terem nascido com a última chuva, existe no entanto um enorme risco de ver legiões de neófitos sucumbir pela sua inocência à demagogia.
Esta é a eterna contradição dos movimentos alternativos maduros: objectos apetecíveis mais ou menos íntegros, quando apanhados entre dois fogos contraditórios: o seu crescimento baseou-se numa recusa do poder [ou pelo menos da sua lógica implacável], mas agora sentem-se tentados a exercê-lo....
Traduzido por PP
PS - Ter nascido com a última chuva = Ter nascido ontem; mas gosto mais da versão francesa da coisa: tem muito mais poesia....
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