Ainda os fogos: comunicado da CPADA
Junto segue o comunicado da CPADA enviado no dia 31 de Julho sobre o tema dos fogos florestais.
FAÇA-SE JUSTIÇA CONTRA OS INCENDIÁRIOS
O Estado faz parte do problema ou parte da solução?
O dramatismo e a dimensão dos actuais incêndios florestais põem em evidência uma situação que continuará por muitos anos enquanto o Estado Português não tomar medidas drásticas de criminalização dos agentes activos pelo surgimento de incêndios florestais e a desmobilização dos principais beneficiários com os negócios associados a estes incêndios.
As consequências económicas dos incêndios florestais são amplamente conhecidas: prejuízos públicos, vidas e bens em risco, avultados investimentos em equipamento e meios de combate aos incêndios, notícias "escaldantes" e eventuais benefícios privados.
E embora muitas destas áreas comportem uma diversidade biológica reduzida e um menor interesse para a conservação da natureza, em sentido restrito, as consequências ambientais destes incêndios não são de desprezar, como sejam a exposição dos solos a fenómenos de erosão, a desertificação, o aumento de caudais de ponta de cheias e de riscos associados a inundações, no Inverno, a perda de capacidade de recarga dos aquíferos e, ainda, um aumento da carga de CO2 na atmosfera.
Os fogos florestais são um problema ambiental em cujo combate a Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente e muitas das suas associadas se têm empenhado nos últimos anos, sob o lema "prevenir os fogos florestais todo o ano".
As razões para a ocorrência de fogos florestais em tão grande número e dimensão são conhecidas, apresentando-se as condições climatéricas, o tipo de culturas, a carga térmica acumulada, a negligência nas actividades humanas nas matas, o fogo posto e os interesses económicos pouco claros como as razões mais citadas.
Várias medidas básicas de prevenção se podem enunciar:
• medidas preventivas de incêndios, onde se contam a limpeza de matas, abertura de caminhos e aceiros;
• manutenção de açudes e planos de água;
• outras medidas visando dificultar propagação dos incêndios, como a alternância de espécies e modos culturais, evitando monoculturas extensivas;
• restrição de cultivo de espécies pirofóricas aos solos adequados para tal;
• medidas para detecção prévia de focos de incêndio, incluindo detecção remota e equipamento de tele-vigilância para o qual existe tecnologia nacional;
• incremento da fiscalização das actividades nas matas portuguesas;
• medidas para promover a ocupação dos espaços e a vigilância com a utilização de grupos organizados da sociedade civil ou meros cidadãos, em complemento de actividades de lazer e usufruto do contacto com a natureza.
Outras medidas complementares são possíveis conceber:
• no domínio da fiscalidade, com incentivos fiscais em função das despesas de limpeza e preservação das matas;
• incentivos ao cultivo de espécies autóctones e de crescimento lento, como as que melhor resistem aos incêndios florestais
• co-responsabilização dos proprietários nas ocorrências de fogos nas explorações à sua responsabilidade;
• promoção de associações de proprietários ou responsáveis de explorações florestais com o objectivo de facilitar a aplicação de medidas e investimentos na prevenção de fogos florestais;
• na promoção da produção de energia a partir de biomassa florestal, garantindo a sua valorização e a viabilidade económicas das actividades de limpeza de matas;
• na promoção da compostagem de resíduos florestais;
• na promoção dos produtos das matas portuguesa não directamente associados à madeira;
• na promoção de condições para um usufruto de actividades de turismo e lazer nas matas portuguesas por parte das populações;
Essas medidas devem ser aplicadas e acarinhadas pelas autoridades competentes, contribuindo para promover a sustentabilidade da floresta portuguesa.
A sua eficácia depende da sua concretização ao longo do ano, pois já se têm verificado incêndios florestais fora de época e em períodos de mais calor.
O seu custo é uma fracção do custo das medidas de combate aos incêndios.
O seu retorno tem, para além dos aspectos económicos e ambientais positivos resultantes da gestão racional dos espaços florestais, uma componente social, envolvendo organizações da sociedade civil na resolução de um problema nacional.
Até (1999) existiu um programa de prevenção de fogos florestais que consistia num financiamento de protocolos e projectos por parte do CNEFF, às Organizações Não Governamentais de Ambiente, para a realização de actividades de prevenção, informação, sensibilização e vigilância de matas e florestas que, por questões orçamentais, não foi retomado.
A existência de períodos de fogos florestais com a intensidade com que têm ocorrido todos os anos é uma denúncia clara e inequívoca na insuficiência das medidas de prevenção que têm sido praticadas e promovidas pelas autoridades competentes, e uma demonstração cabal da necessidade urgente de medidas mais eficientes na gestão sustentável da floresta portuguesa.
Mas para além das medidas enunciadas a Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente/ONGA, entende que, perante a situação de calamidade que agora se observa:
a) os incêndios florestais são um problema público. As consequências económicas e sociais deste flagelo afectam não apenas os proprietários directamente atingidos mas todos os cidadãos, nomeadamente, enquanto contribuintes para a sua resolução através de impostos pagos ao Estado;
b) a Justiça deve actuar imediatamente. O Estado através das entidades competentes deve acelerar e intensificar a investigação tendo em vista a criminalização dos agentes activos responsáveis pelo surgimento dos incêndios florestais, cujo papel deve ser agravado como causa principal deste fenómeno;
c) o Governo português deve atribuir aos incêndios florestais o estatuto de situação de emergência, nos próximos três anos. Deste modo, deve assumir um controlo mais directo do combate a incêndios desta natureza e regular de forma mais restritiva a comercialização dos produtos ardidos, reduzindo as oportunidades de negócio resultantes deste fenómeno;
d) o Estado deve transferir o esforço de combate aos incêndios florestais para as Forças Armadas portuguesas, nomeadamente para o Exército e a Força Aérea, em regime de excepção conforme atrás exposto. Esta medida deve ter como consequência a eliminação do negócio privado de combate a incêndios, nomeadamente ao nível dos meios aéreos. O conceito de Defesa Nacional é compatível com o combate aos fogos florestais, nomeadamente no que concerne à protecção das populações. Em abono do mérito desta missão deve referir-se que a Confederação tem reconhecido publicamente (através do Prémio Nacional de Ambiente Fernando Pereira) o papel desempenhado por diversos sectores das Forças Armadas e da Forças de Segurança (nomeadamente a Guarda Nacional Republicana através do SEPNA) na protecção do ambiente em Portugal;
As organizações da sociedade civil estão disponíveis e interessadas em colaborar com as autoridades competentes no desenvolvimento de actividades de prevenção de fogos florestais, informação, sensibilização, formação, pareceres técnicos e opinião em relação a projectos de ordenamento florestal, actividades de animação, ocupação dos espaços e vigilância das matas, assim lhe sejam proporcionados meios para a sua concretização. A sociedade civil é, decididamente, parte da solução no problema dos fogos florestais.
Num momento em que é defendida publicamente a necessidade de expansão das explorações florestais e da vocação florestal do país, compete ao Estado e às autoridades com tutela decidirem se querem continuar a fazer parte do problema ou parte da solução.
A Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente solidariza-se com as autarquias locais mais atingidas por este problema e elogia a coragem da Senhora Presidente da Câmara Municipal de Vila Rei em denunciar as causas mais hediondas que estão associadas à emergência de incêndios florestais em Portugal.
CPADA
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