Uma surpresa desagradável - sobre a entrevista dada ao 'Público' por Ulisses Garrido
A entrevista que Ulisses Garrido deu ao Público no passado dia 20 de Julho irritou-me. Porquê? Porque o Garrido por palavras e actos, no decurso da preparação do Forum, sempre teve uma atitude diferente, não sectária. Não embarcou nos vários truques, golpes e habilidades com que alguns ao longo dos meses nos foram brindando, fazendo perder um tempo precioso. Ao ler as respostas do Ulisses, fico com a sensação (desagradável) de que ele está a enviar sinais de fumo, numa espécie de autocrítica muito comum nos sectários. Afirmar que a ruptura da manifestação foi culpa de todos é no mínimo confundir as situações, o que, longe de ajudar, só amplia as desconfianças. Todos quantos participaram nas mais de quinze longas horas de discussão, ao longo de três sessões, para se tentar conseguir o acordo sobre a ordem da manifestação, sabem que o PCP se recusou até ao fim a aceitar desfilar conjuntamente com os outros partidos no fim do cortejo, como se recusou até ao fim a indicar o lugar onde aceitaria manifestar-se. «Os nossos militantes gostam de se manifestar com a nossa bandeira e não os podemos impedir de se espalharem pela manifestação», afirmou o Ângelo Alves, membro do CC do PCP.
Este tipo de conversa sempre foi intolerável. Hoje, é absurda. Tudo isto se passou com a cumplicidade dos representantes da União de Sindicatos de Lisboa da CGTP. Só esta atitude determinou que um leque muito variado de organizações se reunissem para dar resposta a esta golpada, organizando uma manifestação separada. E foram estas organizações que convidaram todos os partidos (menos o PCP, naturalmente) a integrar o fim do nosso cortejo.
A este propósito, alcunhar as associações ecologistas de «fundamentalistas» porque não estiveram, nem estarão, de acordo com este tipo de práticas não é bonito e também não ajuda a resolver os problemas da desconfiança. Além de mais, o termo «fundamentalista» faz lembrar a linguagem do Império, a propósito de outras guerras.
Tomo nota ainda da receita do entrevistado para resolver o problema do «brilho das personalidades»: com mais personalidades. Não será de fazermos um esforço para trazermos mais associações, mais sindicatos, mais jovens, mais mulheres, mais imigrantes, e batermo-nos todos para que se respeitem os critérios que livremente aceitamos, dando um lugar de destaque aos jovens, às mulheres, e principalmente às vítimas do sistema, por exemplo, os desempregados?
Caro Garrido, não é necessário afirmares que o Fórum não é um movimento dos movimentos, só porque o Avante diz que não é. Não confundas o Avante com a Bíblia, mesmo em tempo de Congresso. A entrevista que deste, além de mais divisionista do que aquilo que o PC censura aos jornais, é um modelo acabado do remédio para afastar todos quantos não estão dispostos a aturar as práticas do sectarismo. Por isso uso esta via para te responder. Medita nesta questão em tempo de Congresso.
Um abraço,
Carlos Antunes
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