«A democracia não podia sobreviver neste reino de penúria e de necessidade; antes de ser substituída pela ditadura pessoal, já tinha perdido a confiança em si mesma. Aliás, em França temos obrigação de o saber: quando as condições materiais e as necessidades da situação são tais que a crítica torna-se ilusória e as reivindicações ineficazes, o espírito crítico e a energia reivindicativa morrem por si; o cepticismo, o desencorajamento, o deixar andar instalam-se. A ditadura, o culto do chefe, o apelo aos homens providenciais aparecem porque a crítica democrática mostrou a sua ineficácia demagógica, porque os cidadãos descobriram-se incapazes de controlar os problemas materiais da colectividade e de alcançar quaisquer resultados pela afirmação das suas necessidades e dos seus interesses imediatos. A ditadura só se pode impor quando a colectividade já se tornou um objecto estranho a si própria: quando os indivíduos já não acreditam nem na sua própria vontade nem na sua capacidade em resolver os seus problemas, nem nas promessas muitas vezes mistificadoras, porque são abandonados e desencorajados pela inutilidade das suas reivindicações e das suas lutas e veem estas como agitações estéreis. Porque os problemas já não estão ao seu alcance, porque as causas das suas infelicidades lhes escapam e permanecem-lhes exteriores, encarregam um salvador de agir por fora sobre estas causas e alienam o seu julgamento e o seu poder de decisão a especialistas de administração pública.»
André Gorz in La Morale de l'histoire, Editions du Seuil, 1959, pág. 41.
Tradução BSP.
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