Em entrevista exclusiva, Richard Stallman, um dos pais do software livre, defende o brasileiro Sérgio Amadeu, alvo da Microsoft.
Rafael Evangelista (Outras Palavras)
Se alguém goza de prestígio dentro da comunidade de software livre esse alguém é Richard Stallman. O próprio Linus Torvalds, o pai do Linux, coloca-se na posição de um simples engenheiro e chama Stallman de "grande filósofo". No início dos anos 80, Stallman sistematizou os princípios básicos da filosofia de partilha e liberdade contidas no movimento software livre. Liberdade para usar, alterar, copiar e distribuir tornou-se um mantra para aqueles que escrevem códigos de computadores mas também teve um efeito explosivo para toda a produção cultural. O chamado copyleft (antónimo do copyright) está a transformar-se na utopia possível para toda a produção alternativa e libertária.
No campo da tecnologia da informação, o sistema operacional GNU (criação de Stallman) /Linux incomoda a gigante monopolista Microsoft já há algum tempo. A actuação do governo brasileiro, que vem insistindo em dar preferência aos programas livres, foi a gota de água. Na semana passada, a Microsoft iniciou um processo judicial que pode dar origem a um processo por calúnia contra Sérgio Amadeu, o director do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI). Amadeu teria comparado a oferta gratuita do Windows da Microsoft à prática dos traficantes, que oferecem a primeira dose de graça.
O próprio Amadeu, durante o último Fórum Internacional de Software Livre, já tinha dito que as próximas batalhas seriam jurídicas. A viabilidade técnica do uso dos sistemas livres já está comprovada e, ao monopólio, só restaria tentar travá-los legalmente.
Nesta entrevista exclusiva ao Planeta Porto Alegre, Stallman comenta os passos do gigante para travar a adopção do software livre pelos brasileiros. Grande conhecedor do Brasil, o qual já visitou diversas vezes, Stallman considera as escolas brasileiras como um ponto-chave. A iniciativa certamente terá um efeito multiplicador e outros países a tomarão como exemplo.
Não é por acaso que o gigante está-se a mexer.
Você classificaria a atitude da Microsoft como um acto de desespero ou como uma manobra estratégica?
Eu classificaria como um movimento tático, já que estratégia refere-se a algo em grande escala. Eu acredito que a Microsoft ainda não tenha chegado ao desespero, acho que eles ainda acreditam que vão ganhar e que manterão um império permanente sobre os utilizadores de computadores do mundo.
Qual a importância da preferência brasileira pelo software livre?
Se o Brasil adoptar verdadeiramente uma política completa e consistente de apoio ao software livre, este pode ser o ponto-chave de nossa campanha pela liberdade. Por exemplo, uma política clara para que as escolas usem apenas software livre nas salas de aula colocaria o Brasil no caminho da liberdade e serviria de modelo e inspiração para outros países.
Você concorda com a comparação entre a Microsoft e os traficantes de drogas?
O próprio Bill Gates parece concordar com essa comparação, de acordo com essa citação:
"Embora três milhões de computadores sejam vendidos cada ano na China, as pessoas não pagam pelo software. Um dia eles pagarão, penso eu. E mesmo enquanto eles estão roubando, queremos que eles nos roubem. Eles ficarão como que viciados e um dia, de algum modo, vamos descobrir como cobrá-los na próxima década."
Citação retirada da revista Fortune, dia 20 de julho de 1998.
No entanto, prefiro comparar a Microsoft com a indústria do cigarro, esses vendedores de drogas legalizadas. Eles distribuem amostras grátis e cigarros de chocolate para fazer com que as crianças comecem a fumar. Hoje, a Microsoft dá amostras grátis do Windows para escolas e estudantes. As escolas deveriam recusar-se a fazer parte desse jogo.
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