Os organizadores do segundo Fórum Social Europeu (FSE) contam com mais de 40 mil participantes nos quatro dias de debates deste encontro altermundialista (novo nome do movimento antiglobalização), organizado a partir de hoje e até dia 15, em Paris e três cidades da região parisiense – Saint-Denis, Bobigy e Ivry-sur-Seine. Mas a manifestação de encerramento, sábado à tarde, em Paris, não baterá certamente o recorde do primeiro FSE, em Florença, há um ano. Meio milhão de pessoas tinham desfilado nessa altura na cidade italiana, na maior mobilização de sempre contra a guerra no Iraque.
Este ano, o FSE debruça-se sobre a construção europeia. Um milhar de organizações inscritas em Paris entendem militar por uma “Europa dos cidadãos e dos povos” com uma forte componente social. Os movimentos altermundialistas rejeitam o modelo “ultraliberal” que lhes parece dominar o projecto de constituição europeia, actualmente em discussão na UE. Meia centena de sessões plenárias, duas centenas e meia de seminários, várias centenas de ateliers vão estudar em Paris temas tão diversos como “Protecção social, saúde, reforma”, “Globalização e militarização, política imperial”, “Desenvolvimento dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais”, “Os movimentos sociais e os partidos políticos”, etc.
Não obstante esta temática algo árida, o segundo FSE promete ser marcado por uma certa cacofonia típica destes encontros proteiformes. Herdeiro regional do Fórum Social Mundial (2001) lançado em 2001 em Porto Alegre, no Brasil, em reacção contra o Fórum Económico Mundial (FEM) de Davos, na Suíça, considerado como paradigmático do neoliberalismo, o FSE não escapa à tendência do FSM de deixar partir os debates em todos os sentidos onde os levem as reflexões e propostas feitas, sem qualquer rigor de retórica. Mas significa isto que o movimento não faz nenhum contributo para a sociedade contemporânea, como o pretende o politólogo francês Nicolas Tenzer, que vê no FSE uma “manifestação da insígnia pobreza das teses altermundialistas”?
Os seus detractores criticam antes de mais o facto de os altermundialistas recusarem entrar no jogo tradicional da política e do poder, colocando-se assim nas margens da contestação, sem apostas construtivas para o futuro. Mas em apenas alguns anos de existência, o movimento já marcou com o seu cunho progressos incontestáveis alcançados em domínios tão diversos como o apagar da dívida dos países mais pobres, o direito dos doentes dos países mais pobres aos medicamentos a preços acessíveis, a necessidade de os países ricos reduzirem os subsídios às respectivas agriculturas, que asfixiam a agricultura dos países pobres, ou ainda a transparência das instituições internacionais.
Estes sucessos devem tanto à contestação, “como às propostas concretas feitas pelas associações e pelas organizações não governamentais (ONG)” omnipresentes nos fóruns altermundialistas, frisa Henri Rouillé d’Orfeuil, um antigo diplomata francês reconvertido hoje na coordenação de ONG gaulesas de solidariedade internacional. Prova cabal desse sucesso, os partidos políticos franceses namoram todos desaforadamente com o FSE de Paris, a ponto de os organizadores ironizarem sobre “a reverência obrigada” dos partidos.
Para além da contribuição de meio milhão de euros do Governo conservador francês para o FSE, e das observações da direita gaulesa sobre a “necessária humanização da globalização”, uma vintena de partidos comunistas e socialista europeus exprimiram, antes da abertura do Fórum, o desejo de instaurarem um diálogo permanente com os movimentos sociais e cidadãos que o compõem. Mas nenhuma organização política é autorizada a participar no FSE. O movimento altermundialista formou-se a partir da sociedade civil e de uma mobilização social que, precisamente, não se sentia escutada nem representada pelos partidos tradicionais. A questão da tradução política da acção do FSE está assim colocada, em filigrana, no grande encontro de Paris.
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