sábado, agosto 02, 2003

O negócio do armamento e o complexo industrial-militar

por Jorge Cadima (Professor universitário. Intervenção no Forum Social Português a Jun/2003)



"As despesas militares dos EUA são realmente colossais. Vale a pena considerar a dimensão dos recursos envolvidos. O Orçamento militar pedido pelo Governo dos EUA para o ano de 2004 é de 399,1 mil milhões de dólares: 379,9 mil milhões para o orçamento do Ministério da Defesa e 19,3 mil milhões para o programa de armas nucleares do Ministério da Energia. Trata-se duma verba astronómica, que corresponde a mais de mil milhões de dólares por dia em despesas militares, mais de 46 milhões de dólares por hora, mais de 760 mil dólares por minuto.

Compare-se aquilo que os círculos dirigentes dos EUA gastam na sua máquina de guerra e morte, com aquilo que seria preciso para pôr cobro aos grandes flagelos sociais que afectam muitos milhões de seres humanos. No Relatório de Desenvolvimento Humano de 1998, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), inclui-se (p. 37) uma tabela com estimativas do « custo anual adicional para atingir o acesso universal aos serviços sociais básicos em todo os países em vias de desenvolvimento ». Com mais 6 mil milhões de dólares por ano, seria possível garantir educação básica para todos. É a verba que os EUA gastam em menos de 5 dias e meio de despesas militares . Com mais 9 mil milhões de dólares, seria possível garantir água e saneamento básico para todo o planeta. É quanto os EUA gastam em 8 dias e meio de despesas bélicas. Com mais 13 mil milhões de dólares, seria possível garantir saúde básica e nutrição em todos os países em vias de desenvolvimento. A máquina militar dos EUA consome isso em menos de 12 dias .

Trata-se, como é evidente, de um problema de opções políticas. Em 1998, as despesas militares mundiais foram de 780 mil milhões de dólares. A superpotência capitalista dos nossos dias é responsável por cerca de metade dessa verba. As suas despesas militares são, pois, equivalentes às do resto do planeta.

Esta colossal máquina de morte e destruição alimenta-se do famoso “dinheiro do contribuinte”. São essencialmente os orçamentos públicos que financiam as despesas militares (em material, pessoal ou serviços). Mas os lucros resultantes beneficiam (em particular nos EUA, mas cada vez mais nos restantes países também) empresas do sector privado. A alegada alergia do sector privado pelo Estado é, neste como noutros campos, uma ficção: a alergia diz apenas respeito às funções sociais do Estado, e não ao seu papel como fonte de lucros e de poder para o capital privado."


"Por detrás das muitas acusações de “subsídio-dependência” e “desperdício do erário público” que nos habituámos a ouvir, quando se trata de subsidiar empresas socialmente úteis em situação económica difícil, ou as funções sociais do Estado (Ensino, Saúde, Segurança Social), há uma “pacífica” convivência com a subsídio-dependência desta indústria da morte e destruição que desperdiça somas colossais dos dinheiros públicos."

"Longe de “não gostar do Estado”, o capital (e, em particular, o complexo militar-industrial) gosta tanto dele que o utiliza sistematicamente para criar artificalmente os mercados, pagar as despesas, subsidiar e assegurar a continuação dos seus lucros. O Estado, nas condições do capitalismo actual, é uma placa giratória aonde entram e saem os directores das grandes empresas, para promover e alimentar os seus negócios. O actual Governo dos EUA é o Estado-Maior da indústria petrolífera e militar, o Estado-Maior do complexo militar-industrial, que traça e define a política dessa superpotência em função dos interesses económicos da casta que representa."

"É por isso que há que combater a ideia defendida por alguns, por vezes de forma bem intencionada, de que seria necessário fomentar a militarização da União Europeia a fim de “fazer frente” aos EUA. Esta militarização, que está em marcha, e a criação de um Exército Europeu (para financiar o qual alguns até propõem a criação de impostos especiais) seria altamente prejudicial. Não apenas porque faria aumentar os perigos de guerras, quer contra povos do Terceiro Mundo, quer mesmo entre potências capitalistas. Não apenas porque as despesas colossais de uma tal militarização seriam seguramente pagas com dinheiros retirados à educação, à saúde, à segurança social. Mas também porque a militarização da UE alteraria profundamente a correlação de forças no seio das sociedades europeias, fortalecendo os sectores mais reaccionários, mais belicistas, mais ligados ao imperialismo. Os EUA são hoje uma potência militarista e agressiva, não porque os americanos sejam “intrinsicamente maus”, tal como os europeus não são “intrinsicamente bons” (como mostra a nossa História). A política actual dos EUA é o fruto do enorme poder e influência que o complexo militar-industrial detém naquela sociedade. O fortalecimento de um complexo militar-industrial europeu teria por efeito, independentemente das intenções dos seus defensores, o reforço das características imperialistas da União Europeia.

O caminho tem de ser outro: o da luta por uma política diferente, uma política de paz e cooperação entre os povos. Que exige um outro Mundo, possível e necessário."


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1 comentário:

Anónimo disse...

...é triste e frustrante...
pensar que existem MAIS de vinte milhões de refugiados;
que UM TERÇO DO MUNDO não tem electricidade;
que 1,1 MILHÕES de pessoas NÃO TÊM água potável;
que MAIS de cem milhôes de crianças NÃO VÃO á escola e que um sexto da população vive COM MENOS de 1 dólar por dia...

COMO PARAR COM ISTO?
VER O NOTICIÁRIO EM CASA CHORAR E NÃO SE LEMBRAR MAIS...
NÃO RECRIMINO QUEM O FAZ.. EU FAÇO-O. E SOFRO COM ISSO. COMO É POSSIVEL?
O QUE FAÇO?!