PELO TEATRO
UM APELO AO PROTESTO (DO) PÚBLICO
O Ministério da Cultura abriu concurso em 2002, como anualmente o faz, para a atribuição de subsídios destinados à actividade teatral, nas rubricas de projectos pontuais e anuais, a realizar ao longo do ano de 2003. Um júri nomeado para o efeito seleccionou um conjunto de candidaturas que considerou manifestarem a qualidade e o interesse artísticos, merecedores de um apoio estatal necessário à sua concretização. A proposta de atribuição de apoio foi comunicada aos candidatos em Fevereiro de 2003. Passou-se meio ano e nem sequer os documentos de homologação destes apoios foram emitidos (documentos que, por exemplo, permitiriam a que os candidatos contraíssem empréstimos à banca, usufruindo de linhas de crédito existentes, destinadas a actividades culturais com financiamento estatal). Não há certezas, portanto, quanto à data em que as verbas prometidas serão entregues. Entretanto, há projectos que são adiados sine die, ou simplesmente cancelados por impossibilidade da sua realização. Outros espectáculos, porém, são levados a efeito, por calendarização já agendada com espaços previstos, ou por múltiplos compromissos assumidos pelos proponentes que inviabilizam qualquer tipo de adiamento.
Não é minimamente aceitável nem dignificante, em termos profissionais e artísticos, que actores, encenadores, produtores, cenoplastas, figurinistas, luminoplastas, dramaturgos e dramaturgistas, e outros criativos e/ou técnicos da cena, trabalhem sem salários, numa situação insustentável de endividamento à espera de um Godot mecenas que não chega. Ainda para mais porque a precariedade financeira é agravada nas estruturas de pequena dimensão, candidatas aos apoios pontuais e/ou anuais. O subsídio à actividade teatral de iniciativa não governamental, bem como à actividade cultural em geral, é um direito dos cidadãos, não um privilégio (conforme o enuncia a Portaria nº 1056/2002, de 20 de Agosto). Trata-se de um serviço público insubstituível que é prestado através destes agentes artísticos, uma vez que o Estado se manifesta incapaz de assegurar este serviço através das estruturas por si tuteladas. A criação de públicos para o teatro, aliada à possibilidade de inovação e experimentação, passa necessariamente pelos agentes artísticos que neste momento se encontram defraudados nas suas expectativas. A cultura é um bem essencial, não um adereço supérfluo. Os cidadãos têm direito a usufruir de um teatro que não se reduza em exclusivo a um entretenimento mercantilizado; mas que seja antes de mais um meio criador de civilização, como o sonhou o projecto de Garrett para o teatro português. Uma democracia consolida-se e o seu exercício tem lugar quando as mais vastas camadas das populações têm acesso à cultura, ao usufruto dos bens culturais e à fruição de objectos artísticos, que no seu conjunto são liberadores de tutelas, exorcistas de obscurantismos, geradores da livre opção e da escolha consciente do devir individual e social. Se no nosso país não há um público mais vasto para o teatro, é porque nunca houve uma vontade política que definisse um projecto coerente e duradouro para o desenvolvimento cultural neste domínio. De facto, as estruturas de criação e difusão teatral estatais são poucas e incapazes de responder às solicitações do público actual e ainda menos de gerar novas apetências, criando e fixando novos públicos.
O Estado não cumpre as regras que estabelece, não se justifica e não assume qualquer responsabilidade, havendo mesmo estruturas, já subsidiadas, com pagamentos em atraso de anos anteriores a 2003. Convidamos assim todos os espectadores de teatro a darem voz ao nosso protesto, numa causa que lhes é comum, assinando por escrito este documento, ou assinando o livro de visitas no sítio http:\\manifestoteatro.no.sapo.pt , que será posteriormente enviado para o Ministério da Cultura; como forma de expressar uma pessoal e colectiva indignação pelo modo como o Estado está a menosprezar aqueles que contribuem, pela arte teatral, para criar e manter viva a identidade cultural portuguesa.
Comente e assine aqui
PS - esta situação extende-se pelas outras áreas de criação como a música e a dança; quem quer avançar com os projectos, tem que se endividar até ao pescoço deixando as associações num estado calamitoso. Assim vai a cultura em Portugal.....
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